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terça-feira, 3 de dezembro de 2013

A Caminho do Paraíso

A Caminho do Paraíso




Quando eu era criança, das conversas dos adultos sobre a morte, entendia que quem morria ia morar no céu. Ficava, então, imaginando o mundo celeste e vasculhando o céu azul infinito, buscando sinais da comunidade estelar.

Já na pré-adolescência, convivi com amigos de religiões diversas. Convidada, ia com eles e seus familiares às missas, aos cultos, às sessões, às palestras. E ouvia falar sobre o amor ao próximo, sobre solidariedade, sobre os olhos e as mãos de Deus. Ecoava, em minha mente, a frase bíblica “Há muitas moradas na casa do Senhor.”.

De família de trabalhadores, morando de aluguel, a preços dos olhos da cara, ao ver meus pais fazendo as contas e optando entre a roupa dos filhos e o teto, com o chinelinho de borracha arrebentado nas mãos a remendá-lo com um preguinho, eu pensava, com os meus laços de fita: “Por que não vamos morar na casa do Senhor?”

Eu crescia. Crescia com as metrópoles brasileiras. Crescia enquanto crescia Brasília. Crescia, vendo a cidade do Rio de Janeiro mudar de cara. Dos quintais das casas de muros baixos, com mangueiras, pitangueiras, pés de groselhas, de carambolas... Aos áridos arranha-céus, de muros altos e farpados.

Quando jovem, trabalhadora e universitária, para ficar perto da faculdade e baratear os custos da formação, aderi à república de estudantes, aprendendo a viver com muita gente em pouco espaço.

Nessa época, achava que a ideia da república era a mesma da casa do Senhor, contudo, acreditava que no céu o espaço deveria ser bem maior, pois o universo é infinito.

Cheguei à idade adulta, no tempo futuro que, enquanto menina vivia, a imaginar. Constitui família e, como os meus pais, tive que fazer muitas mudanças. Mudando de casa na medida em que o valor do aluguel subia. Buscava moradia, sem privar a família da alimentação e vestuário, e tentando não ter que remendar, com pregos, o chinelinho de borracha. Precisávamos, portanto, manter os nossos olhos na cara, reeditando o ditado, pois “em terra de cegos, somente os quem têm olhos veem.”

Em pleno Século XXI, adulta, vejo a comissão de frente das eleições chegar às portas da Copa do Mundo, de 2014. E sem muito esforço, olhando mais à frente, vejo a massa que soma os duzentos milhões de habitantes brasileiros e que mantém em pé esse berço esplendido. E vejo todos na lona. Sim, na lona, mas ao alto, preparando-se para o salto mortal, equilibrando-se na corda bamba que se estende no batente das Olimpíadas de 2016.

E no Rio de Janeiro, na cidade Maravilhosa, multiplicam-se os clubes-residenciais que acenam com playground, piscinas, churrasqueiras, salões de festa, salões de jogos, estacionamento... Tudo cercado por muros altos. Muros altos e preços aos olhos da cara, numa espécie de apologia, irônica, à  pacificação dessa cidade partida.

E dentro do terreno em construção, visitando o apartamento à exposição, previamente montado e decorado, vemos muitos espelhos. Espelhos por todos os cantos e paredes. Espelhos refletem a luz... Espelhos inventam espaços.

Nos condomínios-clubes dessa arena carioca, o metro quadrado é espelhado na oferta, mas opaco na entrega. Leve e etéreo nas vitrines, para ser chumbado aos ombros de quem o carregar. O espaço da morada de, aproximadamente, cerca de cinquenta a setenta e poucos metros quadrados, aos olhos que se prendem aos espelhos, não passará de terreno de fé.

Os prédios sobem, o espaço aperta, os olhos saltam da cara lá para onde os pés não alcançam. A família de trabalhadores que busca o sonho da casa própria, que busca acordar do pesadelo dos aluguéis, percorre ruas, percorre bairros, atravessa encruzilhadas para subir lajes e perder o chão.

Encantados, há os que contam as moedas para comprarem miragens, numa conta multiplicada. E aqueles que compram as quatro paredes sonhadas, olham o embrulho luminoso de um metro quadrado, reluzente e ampliado ao espelho, e levam, sobre os ombros, o peso, em pacote opaco, do mesmo metro quadrado aos custos de cerca de oito mil, duzentos e oitenta reais e cinquenta e seis centavos. Cada metro quadrado financiado a perder de vidas, banhado em juros que levam os olhos da cara.


Luzia M. Cardoso
Rio de Janeiro, 09 de dezembro de 2013

sábado, 30 de novembro de 2013

Um Folhetim cheio de Preconceitos, Estigmas e Distorções


Um Folhetim cheio de Preconceitos, Estigmas e 

Distorções




Diante da telinha, boquiaberta com tantos estereótipos e preconceitos presentes no folhetim de audiência global, como o empresário rico e ingênuo, a "solteirona megera", profissionais corruptos, entre outros. Eis que, esta semana, vejo-me diante de mais uma pérola, denegrindo a imagem de dois profissionais que compõem a equipe interprofissional do sistema sócio-jurídico: Assistentes Sociais e Psicólogos.

Há, na trama, um casal gay que buscou adotar uma criança, além de ter caído nas malhas da tal "solteirona megera" nas tentativas de barriga solidária. Mas voltando à adoção, depois de ponderações e reflexões, o casal segue os trâmites legais da adoção. Busca o setor oficial, é entrevistado e avaliado pelos técnicos, decide por um perfil de criança menos procurado para a adoção, vai aos abrigos e lá encontra o menino que decide adotar. 

Evidentemente que antes de a criança ir para a casa do casal, para cumprir o período de adaptação, há um processo que corre pela Vara da Infância e Juventude para conceder a guarda provisória à nova família. Apesar da necessidade do período de adaptação, a oficialização da guarda provisória é indispensável, visto que durante aquele período o casal ficará responsável pela supervisão e cuidados para com a criança, devendo prover as suas necessidades e resguardar os seus direitos.

E a partir de então, na rolagem do folhetim, deparamo-nos com os equívocos. 
Vejamos:

1 - Os técnicos do sistema sócio-jurídico agendam uma visita, evidentemente que nas entrevistas anteriores eles solicitaram informações dos adotantes, tais quais telefones, endereços, profissão, horário de trabalho etc, a fim de poderem acompanhar o estágio de convivência, conforme o artigo 45º do Estatuto da Criança e do Adolescente,

"§ 4º O estágio de convivência será acompanhado pela equipe interprofissional a serviço da Justiça da Infância e da Juventude, preferencialmente com apoio dos técnicos responsáveis pela execução da política de garantia do direito à convivência familiar, que apresentarão relatório minucioso acerca da conveniência do deferimento da medida."

2 - Apesar de todas estas informações sobre o casal candidato à adoção estarem lá disponíveis nos documentos da instituição, eis que a personagem Assistente Social liga, em horário de trabalho, para a residência do adotante, para confirmar a data de visita. É atendida por uma terceira pessoa que não consta em seus documentos, mas mesmo assim, é com ela que agenda, desmarca e remarca a visita domiciliar;

3 - Evidentemente que no momento em que a criança é matriculada em escola, ou transferida essa informação deveria constar nos documentos da instituição que avalia a adoção, bem como o horário em que a criança se insere.

4 - Espera-se que nesse período de adaptação, os técnicos confirmem a matrícula da criança na escola, visto tratar-se de um direito, visando assegurar o cumprimento do artigo 33º do Estatuto da Criança e do Adolescente: 

"A guarda obriga a prestação de assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais."

5- As personagens Assistente Social e a Psicóloga chegam à residência, conforme o agendamento feito com uma terceira pessoa. Em dia útil e horário comercial e escolar. Não encontram os adotantes e tampouco o menino mas, mesmo assim, entram e fazem uma espécie de "sondagem" com a pessoa que as recebem. E ouvem a sua história e acreditam em suas palavras, ou seja, de que o casal candidato está se separando e julgam ali que aquela família, com a nova configuração, trará prejuízo para o desenvolvimento da criança. 

6- As personagens Assistente Social e a Psicóloga, na casa dos candidatos à adoção do menino, veem quando o mesmo chega da escola, devidamente acompanhando com um dos candidatos à sua adoção. Uma cena carregada de zelo e afeto. 
Se naquele momento, parecia que as personagens-profissionais seguiram o artigo 42º parágrafo 2º do ECA:

" Para adoção conjunta, é indispensável que os adotantes sejam casados civilmente ou mantenham união estável, comprovada a estabilidade da família."

E ao mesmo tempo, parece que as mesmas personagens-profissionais desconsideravam, ou desconheciam, o parágrafo 4º e 5º da mesma Lei:

" § 4º Os divorciados, os judicialmente separados e os ex-companheiros podem adotar conjuntamente, contanto que acordem sobre a guarda e o regime de visitas e desde que o estágio de convivência tenha sido iniciado na constância do período de convivência e que seja comprovada a existência de vínculos de afinidade e afetividade com aquele não detentor da guarda, que justifiquem a excepcionalidade da concessão."

"§ 5º Nos casos do § 4º deste artigo, desde que demonstrado efetivo benefício ao adotando, será assegurada a guarda compartilhada, conforme previsto no art. 1.584 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil."

6 - As personagens-profissionais não precisaram ouvir os candidatos à adoção, não precisaram ouvir o menino, os professores. Não, bastou a fala de uma terceira pessoa desconhecida no processo. As personagens psicóloga e a assistente social ignoram a cena de cuidado e afeto que presenciaram, e cegas, foram guiadas pela intriga, e imediatamente, decidiram levar a criança de volta para o abrigo. Decidiram, ali, sem avaliação alguma, sem ouvirem os responsáveis, sem ouvirem a criança, sem ouvirem a escola. Não pensam nos prejuízos emocionais que tal ato poderia gerar à criança. Abruptamente, elas retiram a criança de seus guardiões: sem mandato, sem fato, sem provas.

Será que é assim mesmo que os profissionais de Serviço Social e de Psicologia agem na vida real? 

A minha experiência diz que não. Ignora o autor do folhetim que, no âmbito legal, as coisas não acontecem assim. Para um técnico decidir por levar uma criança de seus responsáveis (e na qualidade de guardiões os candidatos à adoção são os responsáveis legais) é necessário constatar maus-tratos ou risco iminente e, mesmo nestes casos, ao abrigando a criança, imediatamente, os profissionais precisam oficializar o fato junto ao Juiz da Vara da Infância e Juventude, em processo e com provas.

Naquela situação da novela, a ideia de "lar com problemas" está carregada de subjetividades que necessitaria de uma avaliação mais profunda, não podendo os técnicos utilizarem da emoção, baseando-se pela intriga feita por terceiros e, tampouco, não poderia recorrer a ação autoritária, utilizando-se abusivamente de seu "poder", para cancelar, elas mesmas, sempre processo, a guarda provisória expedida pelo Juiz.

E é assim que a imagem de profissionais vai sendo manchada, levando a população a temer a assistência dos mesmos, em vez de buscá-la.

Lamentável!

Luzia Magalhães Cardoso 
RJ, 30\11\2013

Referência

sábado, 23 de novembro de 2013

O Tombo




O TOMBO


Ao abrir a janela, deparou-se com um céu azul anil e raios luminosos que se alongavam para o pleno despreguiçar do sol. Via-os entrando pelas frestas das residências para cutucar os sonolentos, como se dissessem:

“Acordem, acordem, venham ver a novidade!”

Seguiu a sua rotina de higiene pessoal  e desjejum. Como de costume, chamou o cachorrinho:

“Ringo, Ringo! Vamos à rua?”

Ringo imediatamente atendeu ao chamado, com o rabinho empinado e balançante, corria feliz. E pulava e lambia o amigo. Quanta alegria! Sempre recebia, com imenso prazer, a tarefa de sempre:

“Pegue a coleira! Vá, pegue a coleira!!

Ringo disparava a procurar a coleira. Voltando feliz para entregá-la ao amigo. Coleira em Ringo, o amigo tratava de pegar o boné e os óculos de sol, os saquinhos para a coleta dos inúmeros 2 que Ringo faria no  caminho.
  
“Venha, Ringo!”

Novamente disparava o cachorro de rabinho feliz, com a ponta da coleira na boca.  Dava um salto sobre o peito do amigo e lhe entregava, à mão, a coleira.

“Pronto!” 

Foram juntos, Ringo e o amigo para a saída de casa. Chaves na fechadura, mão na maçaneta e porta aberta!

Inesperadamente, antes mesmo de a claridade invadir o ambiente, antes mesmo do primeiro passo para ganhar a calçada, uma pessoa devidamente uniformizada, portando um crachá de identificação da  PaPuDos  S.A (Paseo Púbico De los Otros Sociedade Anônima), com a máquina de débito automático à mão, apresenta-lhe um documento que listava as novíssimas tarifas de pedágio. E nas primeiras linhas, podia-se ler:

Caminhadas e corridas simples = R$ 5,00.
Caminhadas com animais domésticos = R$ 10,00.
Crianças com skates, patins ou bicicletas = R$ 15,00.

E, em queda livre, na soleira de sua porta, ele despertou... Vivia na era dos leilões.

Luzia Magalhães Cardoso
Foto, texto e edição
Rio de Janeiro, 23 de novembro de 2013

domingo, 17 de novembro de 2013

A Insana Especulação Imobiliária no Rio de Janeiro (*)

A Insana Especulação Imobiliária no Rio de Janeiro 




Caminhando pelas ruas da Tijuca, mais precisamente na rua Mariz e Barros, deparei-me com um apartamento, situado em um prédio modesto, com lojas de comércio no térreo, e que tinha uma placa na janela:
 "Vende-se ou aluga-se. Tratar pelo telefone xxxxx-xxx"
Liguei. Fui atendida por uma pessoa que me informou o seguinte:
"O apartamento de dois quartos e dois banheiros, para vender, custa R$ 650.000,00. Para alugar são R$ 4.000,00 mensais, além do condomínio de R$ 420,00."
Não acreditava no que ouvia. Ali, diante do apartamento, no meio de uma rua barulhenta, vendo que o prédio não apresentava mais nada além do hall de entrada, corredores, garagem e elevadores. Talvez tenha lá um salão de festas. Talvez.
Coloquei-me na situação de alguém querendo alugar o imóvel e pus-me a fazer as contas:
R$ 4.000,00 - Aluguel do imovel

+ R$ 420,00 - Condomínio
R$ 1.500,00 - Gastos médios mensais com compras de supermercado
R$ 108,00 - Gastos mensais para o Lava a jato para o automóvel
R$ 400,00 - Valor aproximado de compras mensais na feira
R$ 1.500,00 - Mensalidade média das escolas de ensino médio da região
R$ 400,00 - Estimativa do valor em consumo mensal de gasolina
______________________________________
R$ 8.328,00 Total 
Vi que para viver com a corda no pescoço, uma família que tentar morar naquele imóvel terá que ter renda familiar mensal de, no mínimo, R$ 10.000,00.
Tentei entender de onde saem os valores dos alugueis e conversando com um amigo, ele mostrou que o valor estimado do imóvel, R$ 650.000,00, se bem aplicado no capital, poderia render juros anuais de cerca de 7,2%. Ou seja, ao final do ano, se o proprietário bem aplicasse aquele valor, poderia ter acrescido à sua conta bancária cerca de R$ 46.800,00. 
Para entender como se dá o cálculo do valor dos alugueis de imóveis, pensemos assim: se dividirmos o valor estimado referente aos juros anuais (do valor total do imóvel aplicado no capital) pelo número de meses do ano, teríamos a fórmula que vem sendo usada para o cálculo dos alugueis: 
R$ 46.800,00 \ 12 = R$ 3900,00
Então conclui que quem aluga um imóvel, paga ao proprietário os juros equivalentes ao que este receberia se aplicasse (e se aplicasse muitíssimo bem) o valor de seu imóvel no capital.
E mais, se o imóvel ficar vazio e fechado, o proprietário terá que arcar com os custos do condomínio, já com o imóvel alugado, o proprietário livra-se de mais esta despesa. Agora, no refinamento da ganancia tem o valor do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) que é uma taxa a ser paga à prefeitura em decorrência da posse da propriedade. Tem ainda o Seguro Incêndio, pago anualmente, cujo valor é de R$ 120,00 + a Taxa de Incêndio Bombeiros, de R$ 60,00. (*) E quem vai pagar tais taxas? Ah, quem paga o pato é o locatário. Então, o proprietário transfere a quem alugou o imóvel mais uma de sua responsabilidade
Conclui também que o proprietário, ao alugar o seu imóvel, não corre o risco de o valor aplicado render-lhe menos, como poderia ocorrer se aplicasse em ações.

E ainda: o locatário, ao final do tempo estabelecido no contrato, não tem para si nem mesmo um só tijolo do imóvel. Comprou apenas o direito de morar. Um negócio das Arábias!!!!
É triste ver que a classe trabalhadora vive para alimentar o ócio da pequena, média e grande burguesia.

Luzia M. Cardoso 

RJ, 09\11\2013

(*) Publicado pela primeira vez no meu perfil no Facebbok

quinta-feira, 7 de novembro de 2013

PROTEÇÃO SOCIAL BRASILEIRA

PROTEÇÃO SOCIAL BRASILEIRA 1 

Luzia Magalhães Cardoso 



 A discussão sobre a necessidade de uma política de proteção social para as classes trabalhadoras e populares não é recente. Podemos apontar como marco histórico desse processo a construção do Welfare State, no II pós Guerra, nos países centrais e, como molas propulsoras a organização e a capacidade de luta da classe trabalhadora, a divisão do mundo em dois blocos (socialista e o capitalista) e as exigências de qualificação para o trabalho, tendo em vista as demandas do processo produtivo. Assim, fora a partir da II Grande Guerra que materializaram-se direitos historicamente reivindicados pelas classes populares e trabalhadoras em todo o mundo. 

Nesse sentido, a configuração do Welfare State foi fruto da correlação de forças entre os dois principais atores da relação capital X trabalho: os donos dos meios de produção e a classe trabalhadora. Contudo, considera-se também as influências do posicionamento da burocracia do Estado, visto que, dependendo da 
fração de classe com quem esse último segmento se identificar e/ou fizer alianças, projetos podem ser criados, agilizados, ou dificultados, a fim de atender aos interesses que se fizerem presentes nessas alianças. 

Com relação ao Brasil, ao longo da história observam-se avanços e retrocessos na política de proteção social, e que podem ser identificados nos textos das seguintes Cartas Constitucionais: 

• Constituição Brasileira de 1934: incorpora os direitos assegurados pelos trabalhadores, definindo outros para as classes populares (amparo aos desvalidos, à maternidade e à infância; direito à educação primária gratuita etc.); 

• Carta de 1937: assegura o Estado autoritário, e observa-se um retrocesso nos direitos anteriormente assegurados; 

• Constituição de 1988: materializa os avanços garantidos pelo processo de luta dos grupos populares e trabalhadores garantindo a ampliação dos direitos sociais, elevando a Assistência Social à condição de Política Social e integrando-a na concepção de Seguridade Social. 

Nesse sentido, no Brasil, a década de 30 é considerada como o marco histórico do processo de responsabilização do Estado no trato das sequelas da "Questão Social"1, visto que, no primeiro governo Vargas, as reivindicações dos trabalhadores começaram a ser incorporadas, tanto nas legislações trabalhistas quanto na Previdência Social que surge embrionariamente na década de 20, com as Caixas de Aposentadorias e Pensões – CAPs (Lei Eloy Chaves, de 1923). 

A Previdência Social brasileira, iniciada em CAP's, por empresas, foi organizada por categorias profissionais no decorrer dos anos 30, passando a ser executada pelos Institutos de Aposentadorias e Pensões - IAPs. Assim, unificando-se as CAP's por categorias profissionais, foram criados o IAP dos Marítimos, em 1934; dos Comerciários, e dos Bancários, em 1934; dos Industriários, em 1936; dos Trabalhadores de Transportes e Cargas e o IAP dos SErvidores do Estado, em 1938.

Cabe lembrar que à época, os trabalhadores brasileiros estavam organizados em sindicatos, com uma importante e forte influência do Partido Comunista, deflagrando vários movimentos reivindicatórios de peso. 

Para as classes populares, para os trabalhadores informais e para os trabalhadores rurais, a Proteção Social, no período citado, era tratada dentro do modelo de benemerência, ou seja, cabia às instituições filantrópicas. O Estado subsidiava essas instituições, por meio do Conselho Nacional de Serviço Social (CNSS), e oferecia alguns incentivos fiscais. Existiam outros mecanismos de financiamento da benemerência, como os convênios estabelecidos com a Legião Brasileira de Assistência (LBA) e, mais adiante, junto às Secretarias de Assistência Social. 

Materializavam-se dois modelos de Proteção Social: o primeiro, para as classes trabalhadoras, inseridas no mercado oficial de trabalho; o segundo, para as classes populares e trabalhadores não contribuintes da Previdência Social (não inseridas nos IAP's) e, portanto, não amparados pelas legislações. Um modelo nos moldes de Seguro Social (os IAP's), ou seja, tinham direitos aqueles trabalhadores contribuintes; o outro (por meio das instituições de benemerência), no modelo da benesse, ou seja, apresentado como sendo fruto da caridade e da solidariedade dos setores economicamente mais abastados da sociedade. 


Essa dualidade na Proteção Social brasileira se manteve em todos os períodos de nossa história, com traços ainda presentes na atualidade, apesar dos avanços conquistados com a ampliação de direitos sociais, garantidos no texto da Carta Constitucional de 1988, na Lei Orgânica da Saúde, de 1990, na Lei Orgânica de Assistência Social, 1993, bem como na apresentação e na configuração da Política Nacional de Assistência Social (PNAS), aprovada em 2004 e na criação do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), aprovado em 2005. 

Na atualidade, muitas são as análises que apontam para as restrições e para os retrocessos da reforma previdenciária, ocorrida nos primeiros anos do século XXI, bem como da direção política do governo Lula incentivando o Sistema de Previdência Privada. Além desse fato, a Previdência Social brasileira ainda permanece presa ao modelo de Seguro Social, destinando-se apenas aos contribuintes do Sistema Previdenciário (e, na modalidade de segurados especiais, os trabalhadores rurais e pescadores artesanais), excluindo assim todos os outros segmentos pertencentes à classe-que-vive-do-trabalho que não forem contribuintes.

Com relação a esse último segmento, embora a atual configuração da Política de Assistência Social responsabilize o Estado pela assistência e entenda que todos aqueles que necessitarem de assistência social têm direitos aos programas e projetos desenvolvidos em seu interior (atualmente, por meio do Sistema Único de Assistência Social - SUAS), os critérios de inserção e a lógica de execução são dirigidos a segmentos de grupos sociais elegíveis a partir de um valor delimitado de renda per capita mensal familiar (inferior a 1 salário mínimo nacional), que está muito aquém do preço dos serviços e mercadorias indispensáveis à sobrevivência do grupo familiar. 

Observa-se que os Programas de Transferência de Renda, a exemplo do Benefício de Prestação Continuada (BPC) e do Programa Bolsa Família, ambos desenvolvidos pelo SUAS, excluem grande parte da população que vive em situação de pobreza, ao priorizar apenas a rentabilidade econômica, desconsiderando as necessidades sociais presentes em cada grupo familiar, contradizendo, assim, um dos princípios da Lei Orgânica de Assistência Social:  

"Capítulo II – Dos Princípios e das Diretrizes. Seção I – Dos Princípios, Art. 4° “ A assistência social rege-se pelos seguintes princípios: I – supremacia do atendimento às necessidades sociais sobre as exigências econômicas;”  

Ao compararmos as condicionalidades da Previdência Social para a aposentadoria, com as condicionalidades da Assistência Social para o BPC, podemos observar, em ambas, a relação entre a idade e a capacidade para o processo laborativo, em detrimento da avaliação da necessidade social. 

Verificam-se, também, formas diferentes de compreensão sobre a proteção à família do trabalhador, quando comparamos o Programa Bolsa Família (Programa executado pela Política de Assistência Social) com o Salário Família, pago pela Previdência Social. Percebe-se que o primeiro (O Programa Bolsa Família) limita o valor ao máximo de três filhos, além de outras condicionalidades, enquanto que o segundo não limita o número de filhos.

Os denominados “Benefícios Eventuais”, previstos pela Política de Assistência Social, podem também ser comparados aos seus equivalentes, garantidos ao trabalhador amparado pela Política de Previdência Social e, quando avaliamos e comparamos os dois modelos, percebemos que parece que foi demarcado um padrão de cidadania inferior para os segmentos da população não contribuintes da Previdência Social. 

Podemos pressupor que a sociedade brasileira ainda se mantém presa à ideia de que todos os que se esforçarem dentro do mercado de trabalho, por meio do salário, conseguirão elevar o seu padrão econômico e o seu status social. 

Parece haver uma negação de que o acesso à educação, à informação, à alimentação, à habitação, à cultura, e ao próprio trabalho, entre outros direitos sociais, ainda não estão democratizados. Há um processo de esquecimento de que a qualificação, o aperfeiçoamento profissional e a atualização para responder às necessidades do mercado de trabalho se fazem indispensáveis para a inserção e para a permanência no trabalho assalariado, e que isto também demanda recursos econômico. 

E se repete, na história brasileira, a responsabilização da miséria aos cidadãos que não conseguem, por meio do trabalho, adquirir as mercadorias necessárias à sua subsistência, denotando uma provável tendência à negação das consequências das transformações no mundo do trabalho, como: o desemprego estrutural, consequente dos novos padrões de produção que investem em trabalho morto (tecnologia, robótica etc.), diminuindo a necessidade de trabalho vivo (força de trabalho humana); e as novas tecnologias adotadas para o gerenciamento de recursos humanos. 

 Tal reflexão aponta para a exigência de continuidade do debate, a fim de serem revistos os parâmetros para a definição de "necessidades sociais" e do papel do Estado na sua garantia, bem como sobre quais outras políticas sociais devem integrar a Seguridade Social brasileira. 




BIBLIOGRAFIA 



ANTUNES, Ricardo. Adeus ao Trabalho? Ensaio sobre as metamorfoses e a centralidade do Mundo do trabalho. 7ª ed. Ver. Ampl. São Paulo: Cortez; Campinas, SP: Editora da Universidade Estadual de Campinas, 2000. 

CARDOSO et alli. Proteção Social no Brasil: o impasse entre a garantia de direitos e a visão de benefícios. In, Revista Científica Augustus. Publicado em
http://apl.unisuam.edu.br/augustus/artigo.php?ed=24&art=53 
CFESS/CRESS. 

CARTA DE MACEIÓ, AL, setembro de 2000. Disponível em http://www.ts.ucr.ac.cr/decla-003.htm 

CFESS. Conferências e deliberações do XXXIV Encontro Nacional CFESS/CRESS. Brasília, CFESS, 2005. 

COUTO, Berenice Rojas. O Direito Social e a Assistência Social na Sociedade Brasileira: uma equação possível? 2ª ed. São Paulo: Cortez, 2006. 

CRESS 7ª  RA – RJ. Assistentes Sociais: ética e direitos. Coletânea de Leis e Resoluções. 2ª ed. CRESS 7ª  RA – RJ: Rio de Janeiro, 2000. 

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Aurélio. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1995. 

MENDES, Eugênio Vilaça (Org.). Distrito Sanitário: o processo social de mudanças das práticas sanitárias do Sistema Único de Saúde. São Paulo: HUCITEC; Rio de Janeiro: ABRASCO, 1993. 

MESTRINER, Maria Luisa  O Estado entre a Filantropia e a Assistência Social. São Paulo: Cortez, 2001. 

MORAIS, Alexandre (Org.). Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. 17ª  ed. São Paulo: Atlas, 2001. 

MOTA, Ana Elizabete. Seguridade Social no Cenário Brasileiro (1). Publicado em http://www.lpp-uerj.net/outobrasil/. (Disponível em 
 http://locuss.org/joomlalocuss/index2.php?option=com_docman&task=doc_view&gid=5&Itemid=36) 

OLIVEIRA, Jaime A . de Araújo e TEIXEIRA, Sonia M. Fluery. (IM) Previdência Social: 60 anos de história da Previdência no Brasil. Petrópolis, RJ: Vozes; Rio de Janeiro: ABRASCO, 1985.  

SILVA, Vini Rabassa. Conjuntura brasileira e seguridade social: a necessidade de participação para a ruptura com o conservadorismo. In, Revista Virtual Texto & Contextos, n° 3, Ano III, dez. 2004. Publicado em 
http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/fass/article/viewFile/977/757 

VIEIRA, Paulo E. Gadelha. Assistência Médica no Rio de Janeiro – 1920 – 1937: reformas institucionais e transformações da prática médica. (Tese de Mestrado). Rio de Janeiro: instituto de Medicina Social/UERJ, 1982. 

Leis, Decretos e Resoluções:



CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1937. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao37.htm

CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm

LEI 12.435, DE 06 DE JULHO DE 2001. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12435.htm

LOAS. Lei Federal nº 8.742/ 1993. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8742.htm

NORMA OPERACIONAL BÁSICA/SUAS. Resolução n° 27/2005, do CNAS. 

NORMA OPERACIONAL BÁSICA/RH. Resolução n° 01/2007, do CNAS.. 

PNAS. Resolução nº 145/ 2004, do CNAS. 

PROGRAMA NACIONAL DE RENDA MÍNIMA. Lei Federal n° 10.2129/200. 

1- Este texto, revisado para ser aqui apresentado, bem como o Mapa Conceitual, foram publicados em CARDOSO, L. M. (Coord. ) Manual de Recursos da Rede de Proteção Social Básica. II Parte: Região Serrana do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: UNISUAM, 2008. Página 8 a 11. Disponível em http://apl.unisuam.edu.br/portal/uploads/files/regiao_serrana_reload.pdf.

2 - No documento original, no link acima, o Mapa Conceitual apresenta uma breve explicação de cada um dos conceitos ao final do documento, em anexo.



segunda-feira, 4 de novembro de 2013

NECESSIDADES SOCIAIS

NECESSIDADES SOCIAIS¹ 

  Luzia Magalhães Cardoso


Torna-se urgente redefinir o conceito necessidades sociais, visto o contexto histórico apontar para a retração do mercado de trabalho, diminuindo-se as possibilidades de inserção de segmentos sociais que, embora vivam do trabalho, se encontram alijados do trabalho protegido pelas legislações trabalhistas e previdenciárias.

Nesse sentido, pergunta-se: o que são necessidades sociais? Como possibilitar que o cidadão que recorre aos serviços e programas do Sistema Único de Assistência Social consiga, em algum momento, e pelo seu próprio trabalho, prover os meios para a sua existência, e a de sua prole, sem ficar dependente de programas de renda mínima? A fim de contribuir para com o debate, recorreremos a Marx e Engels que compreende o indivíduo como: 

 “(...) um produto histórico, o resultado da atividade de 
toda uma série de gerações, cada uma das quais aos ombros da 
anterior e desenvolvendo a sua indústria e o seu intercâmbio e 
modificando a sua ordem social de acordo com necessidades já 
diferentes”. (Marx, 1984:27) 

Assim, todo o contingente de pessoas que se encontram hoje abaixo da linha da miséria, classificado pela PNAS como em situação de indigência, surge do movimento histórico constituinte da atual estrutura social, política e econômica da sociedade brasileira. Ou seja, a forma como se organizou o sistema de produção e de comercialização dos produtos e serviços contribuiu para a exclusão de uma imensa parcela da população. 

Os avanços da ciência e da tecnologia sofisticaram os instrumentos, dinamizando ainda mais a produção, ao mesmo tempo, os novos recursos tecnológicos necessitam de um número menor de trabalhadores para a sua operação, demandando por uma melhor qualificação da mão de obra. 

Temos então recursos tecnológicos que viabilizam melhores condições de vida e de trabalho àqueles que tiverem acesso às suas inovações, mas tais avanços,  contraditoriamente, se transformaram também em fator de exclusão do trabalho e de aumento da pobreza. 

Criaram-se novos antagonismos, agora não apenas entre o campo e a cidade, entre o trabalho manual e intelectual, ou ainda entre o trabalho produtivo e o improdutivo. Agora, temos também a oposição entre os que têm trabalho e salário e os que não têm. 

Sem os meios para a obtenção dos recursos necessários à manutenção da própria vida: alimentação, habitação, vestuários, transporte etc. uma importante parcela da população brasileira perde a autonomia na condução e na construção de sua própria história, pois ainda está preocupada em garantir a necessidade primária: manter-se viva. 

Parece, então, ser coerente que, até conseguir mudanças significativas em suas reais condições de vida, o segmento social em situação de indigência fique, durante algum tempo, dependente de serviços e programas governamentais ou de grupos sociais voltados à filantropia. Somente após assegurar as condições para garantir as necessidades primárias é que outras necessidades poderão surgir, como o acesso à informação, à cultura, à possibilidade de criação etc. Em seguida, a necessidade de renovação da própria vida pode se tornar uma prioridade, tanto de reprodução biológica quanto de reprodução dos meios de existência. Assim, segundo Marx e Engels (Idem), as relações em família se intensificam e se fortalecem. 

Podemos pressupor, a partir das discussões dos autores citados, que a relação contrária também pode ser uma possibilidade: na medida em que gerações e gerações não conseguem garantir a satisfação de suas necessidades primárias, os laços familiares se fragilizam, pois cada indivíduo precisa cuidar da própria vida e, instintivamente, essa ação é individual. 

A situação de indigência e de pobreza em que se encontram inúmeras famílias e indivíduos decorreu de um processo histórico, provavelmente iniciado pela espoliação e exploração do trabalho de seus ancestrais, deixando para a geração atual, como herança, as precárias condições de vida e a luta diária e insana por sua preservação. 

Se as reflexões de Marx e Engels (Ibidem) acerca das determinações das condições materiais de vida na formação da consciência (inclusive dos valores morais e relações sociais) forem verdadeiras, há que ser considerado o tempo necessário para que cada cidadão, família e grupo, que hoje necessita da política de Assistência Social, possa alcançar autonomia de renda, a fim de que eles próprios consigam providenciar os recursos indispensáveis para a própria existência e de seu grupo familiar. 

Tanto a trajetória histórica de exclusão quanto as consequências do processo de espoliação dos segmentos em situação de indigência podem contribuir para determinar o tempo e o nível de dependência dos mesmos nos serviços e nos programas de Assistência Social. Nesse sentido, pode ser prematuro tentar definir, a priori, o tempo de permanência dos assistidos bem como a forma de desligamento nos programas executados no Sistema Único de Assistência Social (SUAS).

Provavelmente, a dependência inicial nos programa pode ser uma característica do próprio processo de independência, assim como as diferenças nas formas de saída e no tempo de permanência nos programas. 

Para que essa relação de dependência se rompa, e não se perpetue, consideramos como determinantes importantes para a eficácia do Sistema a forma de relacionamento dos gestores e executores do SUAS para com os cidadãos demandatários da Política de Assistência Social, bem como a avaliação permanente da pertinência, da eficácia e da forma de execução dos programas e serviços ofertados. 





BIBLIOGRAFIA 


CARDOSO et alli. Proteção Social no Brasil: o impasse entre a garantia de direitos e a visão de benefícios. In, Revista Científica Augustus. Publicado em http://apl.unisuam.edu.br/augustus/artigo.php?ed=24&art=53


CEFESS. Conferências e Deliberações do XXXIV Encontro Nacional CFESS/CRESS. Brasília: CEFESS, 2005. 

COUTO, Berenice Rojas. O Direito Social e a Assistência Social na Sociedade Brasileira: uma equação possível? 2ª ed. São Paulo: Cortez, 2006. 

CRESS 7ª  RA – RJ. Assistentes Sociais: ética e direitos. Coletânea de Leis e Resoluções. 2ª ed. CRESS 7ª  RA – RJ: Rio de Janeiro, 2000. 

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Aurélio. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1995. 

MARX, Karl e ENGELS, Friedrich. A Ideologia Alemã  - 1º Capítulo - seguido das Teses sobre Feuerbach. São Paulo, Editora Moraes LTDA, 1984

MESTRINER, Maria Luiza. O Estado entre a Filantropia e a Assistência Social. São Paulo: Cortez, 2001. 

MORAIS, Alexandre (Org.). Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. 17ª  ed. São Paulo: Atlas, 2001. 

MOTA, Ana Elizabete. Seguridade Social no Cenário Brasileiro (1). Publicado em http://www.lpp-uerj.net/outobrasil/. (Disponível em 
http://locuss.org/joomlalocuss/index2.php?option=com_docman&task=doc_view&gid=5&Itemid=36) 

SILVA, Vini Rabassa. Conjuntura brasileira e seguridade social: a necessidade de participação para a ruptura com o conservadorismo. In, Revista Virtual Texto & Contextos, n° 3, Ano III, dez. 2004. Publicado em http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/fass/article/viewFile/977/757 

Leis, Decretos e Resoluções: 

LOAS. Lei Federal nº 8.742/ 1993. 
NORMA OPERACIONAL BÁSICA/SUAS. Resolução n° 27/2005, do CNAS. 
NORMA OPERACIONAL BÁSICA/RH. Resolução nº 01/2007, do CNAS 
PNAS. Resolução nº 145/ 2004, do CNAS. 
PROGRAMA NACIONAL DE RENDA MÍNIMA. Lei Federal nº 10.2129/200


1 - Este texto, revisado para ser aqui apresentado, bem como o Mapa Conceitual, foram publicados em CARDOSO, L. M. (Coord. ) Manual de Recursos da Rede de Proteção Social Básica. Parte III: Região do Médio Paraíba. (Projeto de Extensão Acompanhamento do Processo de Implantação e de Execução da PNAS\SUAS no estado do Rio de Janeiro). Rio de Janeiro: UNISUAM, 2009.  Páginas 10 a 15. Até 2010 disponível em http://apl.unisuam.edu.br/portal/uploads/files/regiao_medio_paraiba.pdf  Disponível em http://docplayer.com.br/886431-Manual-de-recursos-rede-de-protecao-social-basica-parte-iii-regiao-do-medio-paraiba.html, acesso em 03\01\21

2 - No documento original, o Mapa Conceitual apresenta uma breve explicação de cada um dos conceitos ao final do documento, em anexo.




domingo, 4 de agosto de 2013

Um apelo, em carta, de uma cidadã apaixonada pelo Parque Ary Barroso







Exmos. Senhores,

Vereadores da Câmara Legislativa do Município do Rio de Janeiro; Deputados da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro; Secretários e Ministro da Pasta do Meio Ambiente


Venho por meio desta falar da importância do Parque Ary Barroso e de sua integração a outras áreas verdes situadas na região da Leopoldina.

Sou moradora da Penha desde os 13 anos de idade e, naquele Parque, pude vivenciar os melhores momentos de minha infância. Lá, pude brincar de bola, peteca, corda, boneca, correr por aquele campo verde, rolar na grama, maravilhar-me com o canto de pássaros, descobrir ninhos caídos pela relva, joaninhas, borboletas esperanças... Esperanças.
Junto à minha e a outras famílias, ouvia verdadeiras aulas ao ar livre sobre plantas, a importância da Serra da Misericórdia para o ecossistema da região, sobre os reinos vegetal, mineral e animal.  Naquele local, à época cursando as séries do que hoje denominam de Ensino Fundamental, conseguia visualizar, e assim entender, a diferença entre insetos e anfíbios, ao observar e conversar com adultos e colegas sobre sapos, pererecas, formigas, louva-deus... Louva-Deus.

Lá, a família, naturalmente, cumpria algumas de suas funções na socialização e na educação de crianças e adolescentes. E o que é mais importante, de forma lúdica. 

E foi assim que, chegando à juventude, ia para aquele Parque estudar, encostada em árvores antigas, de generosa copa. Lá, também encontrei e fiz muitos amigos, como conheci a história de Ary Barroso que dá nome ao Parque, bem como a sua importância na música popular brasileira.

E por ter tido o privilégio de conviver, no Parque Ary Barroso, com pessoas de gerações diferentes, já que lá se reuniam famílias, cresci ouvindo muitas histórias, fantasias e sonhos de crianças, jovens, adultos e idosos e, com esta convivência, aprendi a respeitá-las em suas diferenças. Sim, lá, naquele Parque, eu tive aula de respeito à natureza, aos idosos, aos mais velhos, às etnias, à diversidade. Verdadeira aula de cidadania, com os frequentadores do local. Pois é a convivência, é a relação entre gerações e é a aproximação do homem com a natureza que possibilita o respeito.

Percebia, também, a labuta de muitos chefes de família, pois lá, naquele Parque, muitos pais e mães garantiam o sustento de sua prole, vendendo bola, peteca, algodão doce, pirulito, pipoca etc.. Exerciam um trabalho digno e levavam os filhos, carregando para lá os alimentos para serem repartidos com os mesmos. Enquanto trabalhavam, eles viam os filhos sorrir, correr, brincar, alimentando corpo e alma. Percebiam os olhos reluzentes de felicidade e orgulho daqueles pequenos rostos corados e marejados de suor indo ao encontro do suco, da fruta e do café com leite e isso durante as horas de trabalho dos seus responsáveis.
E ao mesmo tempo eu crescia, e me envolvia com as responsabilidades do mundo adulto – que, infelizmente, afastou-me do tempo da poesia que o Parque emanava – e assim vivenciei o seu fechamento gradativo: a água da fonte desviada, os lagos secando, os peixes morrendo, o mato crescendo, crianças e jovens sumindo, se afastando por medo do que lá passava a ocorrer, até que seus portões foram fechados ao público. E hoje, com muita tristeza vejo o Parque se perder e temo que para nunca mais.

A violência da região foi controlada com as intervenções pacificadoras, contudo, aquele Parque não foi revitalizado, ao contrário, lá se instalaram equipamentos municipais e estaduais que descaracterizam o local. Evidentemente que sei da importância da Unidade de Pronto Atendimento (UPA), do Centro de Referência da Assistência Social (CRAS), da Arena Carioca, da Base da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP), mas não ocupando parte da única área verde daquela região.




No momento em que o mundo começa a se conscientizar da importância da natureza na preservação e na promoção da saúde da humanidade e no momento em que a sociedade começa a perceber que há necessidade de garantir espaços de convivência e lazer para crianças, adolescentes e idosos, vejo degradar uma importante área verde, que se encontra agonizando no coração da Penha. Uma ampla área verde, de 50.000 m², onde foram plantadas 130 espécie de árvores cuja floração ocorre em época alternada; onde foram instalados equipamentos de recreação infantil e quadras esportivas; uma área onde a placa, fixada em frente ao seu portão principal, informa que fora “destinada a servir de área de recreação aos moradores do subúrbio carioca” e, por sua importância, fora tombada como patrimônio histórico, já no ano seguinte de sua criação.




Exmos. Senhores, em 2003 houve a elaboração de um projeto de revitalização do Parque, contudo, até hoje ele permanece abandonado. Percebo, todavia, ser urgente a revitalização de toda a extensão original do Parque Ary Barroso, como também a reativação da fonte, dos lagos e a sua imediata devolução, com portões abertos, segurança garantida, conserto, ampliação e manutenção de equipamentos de esporte, atividade física e lazer para a população infanto-juvenil, adulta e idosa do município do Rio de Janeiro. Que lá possamos, novamente, estar com os nossos filhos, netos, amigos, fazer as nossas caminhadas, exercícios, piqueniques. Que lá, no Parque Ary Barroso, as crianças voltem a correr, pular, rolar na grama, brincar de pique, bola, ficar ao ar livre e descobrir que o verde existe e está tão próximo delas. Que os jovens voltem a se enamorar e sentir seus corações palpitar com a poesia do local.

O Rio de Janeiro é uma cidade com forte potencial turístico, não apenas nos locais conhecidos como as praias da zona sul e Serra da Tijuca. O potencial econômico do turismo da cidade e do estado é muito maior, pois tem equipamentos naturais, históricos e arquitetônicos que possibilitam várias modalidades de turismos (esportivo, cultural, entretenimento etc.).

Na região de que neste momento trato, percebo que há grande potencial para o Ecoturismo na Serra da Misericórdia. Nela, há uma reserva florestal, uma Área de Proteção Ambiental e Recuperação Urbana, APARU, que precisa ser regulamentada; há ainda um lago que surgiu da cratera aberta pela exploração de mineradoras e, integrando nesse complexo o Parque Ary Barroso e o Santuário da Penha, nós teríamos não apenas a revitalização de uma importante área verde no meio urbano, mas a humanização de toda a região, possibilitando novas fontes de renda e dinamizando a economia local. No local poderia ser incentivada a caminhada, aulas ao ar-livre promovidas por escolas, o desenvolvimento de esportes.  
Interligando, por ciclovias, os equipamentos existentes: a Fazendinha (Área de Proteção Ambiental na Penha onde funcionam algumas unidades de ensino); o teleférico do Complexo do Alemão; em Bonsucesso, o Castelo Mourisco e o Museu da Vida (da Fundação Oswaldo Cruz); em Manguinhos, a Quinta da Boa Vista; em São Cristóvão, o Museu do Índio, estádio Célio de Barros, Maracanã e o Parque Aquático Júlio Delamare. Tudo integrado promoveria a saúde, a cultura, o lazer, o bem-estar e a sociabilidade das gerações que moram e passam pelos vários bairros da Região da Leopoldina. Evidentemente que tal projeto, com esta amplitude, necessitaria de esforços conjuntos da sociedade civil e das três esferas de governo, mas garantiria uma qualidade de vida muito melhor para todos os cidadãos cariocas.

Neste sentido, peço especial atenção de todos os Exmos. Senhores para:

1 – Revitalização, renovação dos equipamentos, manutenção e devolução da área verde original do Parque Ary Barroso aos cidadãos cariocas;
2 – Regulamentação da APARU da Serra da Misericórdia;
3 – Integração, por ciclovias, entre o Parque Ary Barroso, Santuário Nossa Senhora da Penha, Fazendinha, o teleférico do Complexo do Alemão, Castelo Mourisco e o Museu da Vida, Quinta da Boa Vista, Museu do Índio, estádio Célio de Barros, Maracanã e o Parque Aquático Júlio Delamare.
4 – Incentivo ao ecoturismo na Região

Nota importante: Tratando-se de assunto de interesse social, e pelo fato de apresentar uma percepção individual, considero importante dá-lo a conhecimento público.

Atenciosamente,

Rio de Janeiro, 04 de agosto de 2013
Luzia Magalhães Cardoso




PARQUE ARY BARROSO


Criado em 13 de dezembro de 1964, situado no quarteirão entre a Rua Flora Lobo e a Av. Brás de Pina, em frente ao Viaduto XXIII, Penha, RJ.