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sábado, 29 de junho de 2019

Praevaricare



Praevaricare


Prevaricar é uma das tantas palavras da língua portuguesa que tem origens do Latim. Vem do praevaricare e significa faltar com os deveres inerentes a um cargo ou função, deixar de cumprir normas, regras, ser conivente com alguma situação ou ato transgressor.

Segundo o Dicionário Etimológico, é uma muito usada em inquéritos. A raiz de prevaricar vem de outra na palavra também do Latim “(...) "varus", (...) "de pernas tortas". "Prevaricar", portanto, seria "trocar as pernas", "andar mal": "sair da linha" (...)”. Ou seja, tem a conotação de andar de forma torta.

Prevaricar, nesse sentido, é tanto uma ação quanto pode ser uma omissão quando tais atos ferirem normas vigentes e, ainda, quando ferirem os códigos e valores éticos, morais e dos bons costumes.

No que se refere ao comportamento dos atores pertencentes à Administração Pública, a prevaricação ocorrerá sempre quando, no exercício da função, o funcionário retardar algo que deveria fazer, ou deixar de fazê-lo ou ainda fazê-lo de forma indevida, fora das orientações legais.

Via de regra, quem prevarica o faz para atender a interesses próprios, tanto para ganhar quanto para não perder alguma coisa qualquer: bens, amizades, cargos, status, fama etc.

Prevaricação é considerado crime cuja pena está prevista no Título XI do Código Penal Brasileiro, onde trata dos crimes contra a Administração Pública e, já no Capítulo I, daqueles praticados por funcionários públicos:

Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal:
        Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.”

A condescender também está presente no comportamento humano. Sendo outra palavra de origem do Latim, condescendere, significa ser tolerante, transigente, flexível.

Mas se nas relações sociais, prevaricar aponta para um deslize, ser condescender, nem sempre. Condescender pode ser uma virtude, quando se trata de aceitar as diferentes formas de vida que não violam direitos, no âmbito das relações funcionais, quando relacionadas ao exercício da função, há regras a serem seguidas, cuja inobservância ou desrespeito são consideradas infrações. Nesse sentido, se flexibiliza a própria maneira de conceber algo, quando ela se firma em padrões preconceituosos e intolerantes.

Por outro lado, no âmbito da Administração Pública, quando se trata de atos e procedimentos de agente público que se desvirtuam do direcionamento normatizados e legais, a condescendência é tipificada pelo Código Penal como condescendência criminosa:

Art. 320 - Deixar o funcionário, por indulgência, de responsabilizar subordinado que cometeu infração no exercício do cargo ou, quando lhe falte competência, não levar o fato ao conhecimento da autoridade competente:
        Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa.”

Prevaricação e condescendência criminosa foram as palavras que insistiram em salta para fora da tela do computador quando da leitura das mensagens reveladas ao público pelo The Intercept Brasil. Ao ler os diálogos travados entre agentes da Administração Pública Brasileira, em grupos organizados em aplicativos fora do âmbito de gestão Administração Pública, essas duas palavras insistiam em manter os olhos arregalados diante de tamanha gravidade.

As conversas que vieram a público, na madrugada de hoje (29\06\2019), apontam para o fato de que os participantes daquele chat estavam conscientes da conduta irregular de um determinado agente público. As conversas mostram até que os atores daquele chat questionavam e criticavam a conduta do outro, contudo, - considerando que tais fatos só estão vindo à tona com a divulgação que vem sendo feita pela mídia – esses mesmos agentes parecem ter sido condescendentes o mesmo, deixando as ações se perpetuarem, fazendo vista grossa, quando não as alimentavam e mantiveram tal comportamento apesar de terem conhecimento das consequências diretas para os cidadãos que estavam sob investigação ou envolvidos em processos judiciais, além de também se mostrarem cientes nas consequências para toda a sociedade, visto a menção à interferência na condução das eleições de 2018.

Ao ler as mensagens, verifica-se que aqueles agentes públicos, sujeitos participantes do chat revelado, não só sabiam das ações que se desvirtuavam das leis e normas institucionais vigentes como também delas participaram, seja por ação ou por omissão, o que denota prevaricação.

Os fatos revelados são muito sérios e graves e, se ocorreram de fato, contribuem para a desmoralização e para o desacredito nas instituições públicas brasileiras e, consequentemente, também desmoralizam e desacreditam os agentes que lá executam funções. As conversas divulgadas revelam comportamentos que deixam a sociedade totalmente escandalizada, além de vulnerável, visto que uma democracia, para ser forte, necessita de instituições pública fortes, confiáveis e respeitáveis, onde a observância e o cumprimento das leis e normas, a imparcialidade e a justiça precisam ser valores resguardados por todos os agentes públicos, já que os mesmos têm o dever de ter conduta ilibada em todos os atos relacionados ao cargo que ocupam e à função que executam.

Luzia M. Cardoso

Nota: as referências estão hiperlinkadas no texto.

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