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domingo, 4 de agosto de 2013

Um apelo, em carta, de uma cidadã apaixonada pelo Parque Ary Barroso







Exmos. Senhores,

Vereadores da Câmara Legislativa do Município do Rio de Janeiro; Deputados da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro; Secretários e Ministro da Pasta do Meio Ambiente


Venho por meio desta falar da importância do Parque Ary Barroso e de sua integração a outras áreas verdes situadas na região da Leopoldina.

Sou moradora da Penha desde os 13 anos de idade e, naquele Parque, pude vivenciar os melhores momentos de minha infância. Lá, pude brincar de bola, peteca, corda, boneca, correr por aquele campo verde, rolar na grama, maravilhar-me com o canto de pássaros, descobrir ninhos caídos pela relva, joaninhas, borboletas esperanças... Esperanças.
Junto à minha e a outras famílias, ouvia verdadeiras aulas ao ar livre sobre plantas, a importância da Serra da Misericórdia para o ecossistema da região, sobre os reinos vegetal, mineral e animal.  Naquele local, à época cursando as séries do que hoje denominam de Ensino Fundamental, conseguia visualizar, e assim entender, a diferença entre insetos e anfíbios, ao observar e conversar com adultos e colegas sobre sapos, pererecas, formigas, louva-deus... Louva-Deus.

Lá, a família, naturalmente, cumpria algumas de suas funções na socialização e na educação de crianças e adolescentes. E o que é mais importante, de forma lúdica. 

E foi assim que, chegando à juventude, ia para aquele Parque estudar, encostada em árvores antigas, de generosa copa. Lá, também encontrei e fiz muitos amigos, como conheci a história de Ary Barroso que dá nome ao Parque, bem como a sua importância na música popular brasileira.

E por ter tido o privilégio de conviver, no Parque Ary Barroso, com pessoas de gerações diferentes, já que lá se reuniam famílias, cresci ouvindo muitas histórias, fantasias e sonhos de crianças, jovens, adultos e idosos e, com esta convivência, aprendi a respeitá-las em suas diferenças. Sim, lá, naquele Parque, eu tive aula de respeito à natureza, aos idosos, aos mais velhos, às etnias, à diversidade. Verdadeira aula de cidadania, com os frequentadores do local. Pois é a convivência, é a relação entre gerações e é a aproximação do homem com a natureza que possibilita o respeito.

Percebia, também, a labuta de muitos chefes de família, pois lá, naquele Parque, muitos pais e mães garantiam o sustento de sua prole, vendendo bola, peteca, algodão doce, pirulito, pipoca etc.. Exerciam um trabalho digno e levavam os filhos, carregando para lá os alimentos para serem repartidos com os mesmos. Enquanto trabalhavam, eles viam os filhos sorrir, correr, brincar, alimentando corpo e alma. Percebiam os olhos reluzentes de felicidade e orgulho daqueles pequenos rostos corados e marejados de suor indo ao encontro do suco, da fruta e do café com leite e isso durante as horas de trabalho dos seus responsáveis.
E ao mesmo tempo eu crescia, e me envolvia com as responsabilidades do mundo adulto – que, infelizmente, afastou-me do tempo da poesia que o Parque emanava – e assim vivenciei o seu fechamento gradativo: a água da fonte desviada, os lagos secando, os peixes morrendo, o mato crescendo, crianças e jovens sumindo, se afastando por medo do que lá passava a ocorrer, até que seus portões foram fechados ao público. E hoje, com muita tristeza vejo o Parque se perder e temo que para nunca mais.

A violência da região foi controlada com as intervenções pacificadoras, contudo, aquele Parque não foi revitalizado, ao contrário, lá se instalaram equipamentos municipais e estaduais que descaracterizam o local. Evidentemente que sei da importância da Unidade de Pronto Atendimento (UPA), do Centro de Referência da Assistência Social (CRAS), da Arena Carioca, da Base da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP), mas não ocupando parte da única área verde daquela região.




No momento em que o mundo começa a se conscientizar da importância da natureza na preservação e na promoção da saúde da humanidade e no momento em que a sociedade começa a perceber que há necessidade de garantir espaços de convivência e lazer para crianças, adolescentes e idosos, vejo degradar uma importante área verde, que se encontra agonizando no coração da Penha. Uma ampla área verde, de 50.000 m², onde foram plantadas 130 espécie de árvores cuja floração ocorre em época alternada; onde foram instalados equipamentos de recreação infantil e quadras esportivas; uma área onde a placa, fixada em frente ao seu portão principal, informa que fora “destinada a servir de área de recreação aos moradores do subúrbio carioca” e, por sua importância, fora tombada como patrimônio histórico, já no ano seguinte de sua criação.




Exmos. Senhores, em 2003 houve a elaboração de um projeto de revitalização do Parque, contudo, até hoje ele permanece abandonado. Percebo, todavia, ser urgente a revitalização de toda a extensão original do Parque Ary Barroso, como também a reativação da fonte, dos lagos e a sua imediata devolução, com portões abertos, segurança garantida, conserto, ampliação e manutenção de equipamentos de esporte, atividade física e lazer para a população infanto-juvenil, adulta e idosa do município do Rio de Janeiro. Que lá possamos, novamente, estar com os nossos filhos, netos, amigos, fazer as nossas caminhadas, exercícios, piqueniques. Que lá, no Parque Ary Barroso, as crianças voltem a correr, pular, rolar na grama, brincar de pique, bola, ficar ao ar livre e descobrir que o verde existe e está tão próximo delas. Que os jovens voltem a se enamorar e sentir seus corações palpitar com a poesia do local.

O Rio de Janeiro é uma cidade com forte potencial turístico, não apenas nos locais conhecidos como as praias da zona sul e Serra da Tijuca. O potencial econômico do turismo da cidade e do estado é muito maior, pois tem equipamentos naturais, históricos e arquitetônicos que possibilitam várias modalidades de turismos (esportivo, cultural, entretenimento etc.).

Na região de que neste momento trato, percebo que há grande potencial para o Ecoturismo na Serra da Misericórdia. Nela, há uma reserva florestal, uma Área de Proteção Ambiental e Recuperação Urbana, APARU, que precisa ser regulamentada; há ainda um lago que surgiu da cratera aberta pela exploração de mineradoras e, integrando nesse complexo o Parque Ary Barroso e o Santuário da Penha, nós teríamos não apenas a revitalização de uma importante área verde no meio urbano, mas a humanização de toda a região, possibilitando novas fontes de renda e dinamizando a economia local. No local poderia ser incentivada a caminhada, aulas ao ar-livre promovidas por escolas, o desenvolvimento de esportes.  
Interligando, por ciclovias, os equipamentos existentes: a Fazendinha (Área de Proteção Ambiental na Penha onde funcionam algumas unidades de ensino); o teleférico do Complexo do Alemão; em Bonsucesso, o Castelo Mourisco e o Museu da Vida (da Fundação Oswaldo Cruz); em Manguinhos, a Quinta da Boa Vista; em São Cristóvão, o Museu do Índio, estádio Célio de Barros, Maracanã e o Parque Aquático Júlio Delamare. Tudo integrado promoveria a saúde, a cultura, o lazer, o bem-estar e a sociabilidade das gerações que moram e passam pelos vários bairros da Região da Leopoldina. Evidentemente que tal projeto, com esta amplitude, necessitaria de esforços conjuntos da sociedade civil e das três esferas de governo, mas garantiria uma qualidade de vida muito melhor para todos os cidadãos cariocas.

Neste sentido, peço especial atenção de todos os Exmos. Senhores para:

1 – Revitalização, renovação dos equipamentos, manutenção e devolução da área verde original do Parque Ary Barroso aos cidadãos cariocas;
2 – Regulamentação da APARU da Serra da Misericórdia;
3 – Integração, por ciclovias, entre o Parque Ary Barroso, Santuário Nossa Senhora da Penha, Fazendinha, o teleférico do Complexo do Alemão, Castelo Mourisco e o Museu da Vida, Quinta da Boa Vista, Museu do Índio, estádio Célio de Barros, Maracanã e o Parque Aquático Júlio Delamare.
4 – Incentivo ao ecoturismo na Região

Nota importante: Tratando-se de assunto de interesse social, e pelo fato de apresentar uma percepção individual, considero importante dá-lo a conhecimento público.

Atenciosamente,

Rio de Janeiro, 04 de agosto de 2013
Luzia Magalhães Cardoso




PARQUE ARY BARROSO


Criado em 13 de dezembro de 1964, situado no quarteirão entre a Rua Flora Lobo e a Av. Brás de Pina, em frente ao Viaduto XXIII, Penha, RJ.