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domingo, 18 de dezembro de 2016

GOELA ABAIXO




Nesta semana que anuncia o Natal de 2016, veio à minha cabeça a vida do peru destinado à ceia de alguns felizes brasileiros que amam saboreá-lo, mas que não sabem que o Brasil é um dos maiores produtores mundiais da santa ave. 

Ave, peru! 

Peru vive em bando e é criado em galpões. A ração é medida de engorda para peso em ouro. A vida do peru de Natal tem, exatamente, vinte e oito semanas ou cento e noventa e seis dias ou quatro mil, setecentos e quatro horas de rotina cerrada: acorda, anda, cisca, engole, caga, trepa e dorme até a hora fatal, quando será embrulhado em papel brilhante e trocado por cerca de R$ 10,00 o quilo por alguém que deseja saboreá-lo na ceia de Natal. 

Contudo, 2016, não foi o ano do peru. No Horóscopo Chinês, 2016 foi o ano do macaco. No jogo de Bicho, 20 é peru e 16, leão. Por outro lado, 2+0+1+ 6 = 9, que é cobra. Nesse baile, roda o peru e dança o macaco. 

Agora, com golpe, Constituição e CLT despedaçadas, PEC, reforma no ensino, reforma na Previdência, tudo isso curtido na penúria da falta de salário e aromatizado por spray de pimenta e gás lacrimogêneo, 2016 trava na goela como um sapo. 

Acontece que, em outubro de 2015, foi apresentado ao povo brasileiro o animal que regeria todo o ano de 2016: o pato. 

Pato plagiado, financiado, plastificado, falso, inflado, indigesto... O pato que se sobressaiu aos ratos e aos gatos dos becos e bueiros da Av. Paulista. O pato que foi jogado na cara refletida no espelho de cada cidadão e de cada cidadã brasileiros. 

Podemos concluir que 2016 foi o ano do pato e em todos sentidos: amplo, restrito, real, virtual, literal e figurado 

Por coerência, brasileira que sou, creio que o prato principal de nossa ceia de Natal deva ser Pato no Tucupi: marinado na chicória e limão; caprichado no alho e na pimenta; fatiado, pedaço a pedaço; assado na panela, para amolecer; finalizado no forno, para dourar! 



Bon appétit! 

Feliz Natal!

Luzia M. Cardoso
              
Rio de Janeiro, 18 de dezembro de 2016

sábado, 5 de novembro de 2016

PROJETO DE LEI DO SENADO Nº 193\2016: QUEREM INSTITUIR ESCOLA SEM PARTIDO OU ESCOLA DE UM PARTIDO?




PROJETO DE LEI DO SENADO Nº 193\2016: QUEREM
INSTITUIR ESCOLA SEM PARTIDO OU ESCOLA DE UM PARTIDO?

Luzia Magalhães C ardoso1


O Projeto de Lei Escola sem Partido foi, inicialmente, apresentado no ano de 2015, pelo Deputado Federal, do PSDB de Minas Gerais, Izaci Lucas
(disponível
em http://www.camara.gov.br/…/prop_mostrarintegra;jsessionid=5… ). Neste ano, o Projeto de Lei foi reapresentado, com algumas modificações, pelo Senador Magno Malta, Partido da República, Espírito Santo e tramita no Senado como PROJETO DE LEI DO SENADO Nº 193, DE 2016, (disponível emhttp://www.senado.leg.br/ativid…/rotinas/materia/getPDF.asp….

Refletindo acerca do título do Projeto de Lei “Escola sem Partidos” deixamos claro que a Escola livre de doutrinações políticas e ideológicas, sem influências partidárias é o que preconiza os princípios constitucionais brasileiros, bem como os éticos do corpo de docente. Também é o que deseja toda a sociedade. 

O referido Projeto de Lei busca se inserir no a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da Educação Nacional       (disponível emhttps://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm).

Ao lermos os dois primeiros artigos do referido Projeto de Lei, e os itens I a V, verificamos a sua correspondência na Constituição Federal de 1988, no Capítulo III, Seção I, artigos 205 e 206. Vemos que a NOSSA CARTA CIDADÃ JÁ DETERMINA QUE TAIS PRINCÍPIOS SEJAM SEGUIDOS:

CONSTITUIÇÃO DE REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988
CAPÍTULO III: DA EDUCAÇÃO, DA CULTURA E DO DESPORTO 
Seção I: DA EDUCAÇÃO

“Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;II         - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber;
III       - pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;
IV       -          gratuidade       do        ensino             público            em       estabelecimentos       oficiais;
V        - valorização dos profissionais da educação escolar, garantidos, na forma da lei, planos de carreira, com ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos, aos das redes públicas; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº
53, de 2006) VI - gestão democrática do ensino público, na forma da lei;VII                 -             garantia          de        padrão            de        qualidade.
VIII                - piso salarial profissional nacional para os profissionais da educação escolar pública, nos termos de lei federal.”

Verificamos, no entanto, que os itens VI a VII e seu parágrafo único e o artigo 5º, itens V e VI do referido Projeto de Lei têm forma e texto distintos do que prega a nossa Carta Constitucional e contribuem para cercear a Educação, contradizendo, se não ferindo, os itens II e III do artigo 206 acima citado. Diz a Constituição no item referenciado:

"Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber; III - pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;"
 
Diz o Projeto de Lei Escola sem Partido:

"Art. 2º. A educação nacional atenderá aos seguintes princípios: VI - educação e informação do estudante quanto aos direitos compreendidos em sua liberdade de consciência e de crença;"
“Artigo 5º. Art. 5º. No exercício de suas funções, o professor: "V - respeitará o direito dos pais dos alunos a que seus filhos recebam a educação religiosa e moral que esteja de acordo com as suas próprias convicções; VI - não permitirá que os direitos assegurados nos itens anteriores sejam violados pela ação de estudantes ou terceiros, dentro da sala de aula. ”
 
VAMOS REFLETIR:

Como que a educação e a informação direcionadas aos estudantes dentro da escola poderão atender à liberdade de consciência e crença de cada um (compreendendo que o Projeto de Lei pretende que crenças e formas de pensar não sejam, de forma, alguma questionadas) e, ao mesmo tempo, atender à liberdade de ensinar, de divulgar o pensamento, garantindo o pluralismo de ideias e concepções pedagógicas (quando as ideias construídas historicamente por renomados filósofos, sociólogos, antropólogos, cientistas sociais, políticos e pesquisadores diversos questionam-se umas às outras, bem como a própria existência humana) sem gerar o contraditório, a reflexão, o questionamento e o debate?

Do mesmo modo ocorre com o item VII do mesmo artigo do referido Projeto de Lei:

"VII - direito dos pais a que seus filhos recebam a educação religiosa e moral que esteja de acordo com as suas próprias convicções."

VAMOS REFLETIR:

Uma coisa é a garantia Constitucional do respeito à liberdade de credo religioso, outra coisa é a Educação que tem como princípio a liberdade, a democracia, o pluralismo e o respeito às diferenças obrigar a cada unidade de ensino garantir que cada um de seus alunos (em sua diversidade cultural, religiosa e de pensamento) adquira o conhecimento existente no mundo (e correspondente a cada nível de ensino), de forma a impedir que o aluno a reflita sobre as suas concepções morais, religiosa e de vida.
Impedir a reflexão fere a própria proposta da Educação que é formar indivíduos aptos à refletirem sobre a própria realidade para nela intervirem, visando as necessidades sociais que são historicamente determinadas.

NESSE SENTIDO, O PROJETO DE LEI APRESENTA UMA CAMISA DE FORÇA E UMA MORDAÇA À EDUCAÇÃO

     O Projeto de Lei, nesses itens, fere a compreensão de que tudo na história se transforma, não só a realidade, como a direção da ciência e a própria concepção sobre o mundo e a existência humana.
Agora, vamos refletir sobre o texto do parágrafo único do artigo VII do referido Projeto de Lei:

"Parágrafo único. O Poder Público não se imiscuirá na opção sexual dos alunos nem permitirá qualquer prática capaz de comprometer, precipitar ou direcionar o natural amadurecimento e desenvolvimento de sua personalidade, em harmonia com a respectiva identidade biológica de sexo, sendo vedada, especialmente, a aplicação dos postulados da teoria ou ideologia de gênero."

Percebe-se haver aí uma confusão entre identidade de gênero e orientação sexual. Uma coisa é a identidade de gênero, o gênero com que a pessoa se identifica, apesar dos componentes sociais e culturais da construção do homem e da mulher presentes na sociedade e em seu próprio grupo familiar e social. Outra coisa e orientação sexual, que é o gênero pelo qual cada pessoa sente atração.

Como a realidade nos mostra, nem sempre a construção social do homem e da mulher, baseados nos aspectos anatômicos, determinam a atração sexual de cada um. Nem sempre a pessoa que nasce com o corpo de mulher ou de homem se sente uma mulher ou um homem, embora tenha sido educada dentro de uma cultura que relaciona a identidade à anatomia.

O texto do parágrafo único também parece confundir o que significa "natural amadurecimento e desenvolvimento" da personalidade do indivíduo, defendendo uma ideia equivocada e preconceituosa de que os indivíduos que não se identificam com o gênero associado à anatomia de seu corpo ou que não sentem atração pelo gênero oposto não "amadurecem e não se desenvolvem em condições naturais".

Daí o Projeto de Lei induzir que existe uma "ameaça na sociedade" que leva crianças e jovens "a um desenvolvimento não natural", portanto, “anormal”.

Como medicação, bem à moda dos choques elétricos e isolamento adotados na idade média para a loucura e doenças incuráveis, e bem à moda da censura das ditaduras, o Projeto de Lei aponta um instrumento para vigiar, controlar e punir os professores que não sigam linha a linha, palavra a palavra, o texto do referido Projeto de Lei: fica instituída a Delação.

Assim, o Projeto de Lei não orienta o debate, conforme todas as democracias. Não, pelo contrário, ele convoca os pais, os alunos e todo e qualquer cidadão a quando se sentirem contrariados ou desrespeitados, antes de buscarem compreender os fatos dentro da própria unidade de ensino, apresentarem a denúncia ao Ministério Público:

"Programa Escola sem Partido: Art. 8º. O ministério e as secretarias de educação contarão com um canal de comunicação destinado ao recebimento de reclamações relacionadas ao descumprimento desta Lei, assegurado o anonimato. Parágrafo único. As reclamações referidas no caput deste artigo deverão ser encaminhadas ao órgão do Ministério Público incumbido da defesa dos interesses da criança e do adolescente, sob pena de responsabilidade."

DEIXO, AQUI, ALGUMAS PERGUNTAS:

 - SERÁ QUE ESCOLAS E PROFESSORES DETERMINAM A ORIENTAÇÃO SEXUAL DE CRIANÇAS E JOVENS?

2 - SERÁ QUE ESCOLAS E PROFESSORES TÊM O PODER DE DETERMINAR A IDENTIDADE DE GÊNERO DE CRIANÇAS E JOVENS?

3 - OS FILMES, NOVELAS, AS PEÇAS DE TEATRO, OS JORNAIS, REVISTAS, LIVROS E MÚSICAS QUE LEVAM À COMPREENSÃO DA DIVERSIDADE DE GÊNEROS E DE ORIENTAÇÃO SEXUAL PRESENTES NA SOCIEDADE CONTRIBUEM PARA INFLUENCIAR A ORIENTAÇÃO SEXUAL E A IDENTIDADE DE GÊNERO DE CRIANÇAS, JOVENS E ADULTOS OU SÃO INSTRUMENTOS PARA ACABAR COM O PRECONCEITO, COM A DISCRIMINAÇÃO E COM A VIOLÊNCIA?
4 - GARANTIR QUE AS DIFERENÇAS SEJAM COMPREENDIDAS, ACOLHIDAS E RESPEITADAS AMEAÇA A SOCIEDADE OU A TORNA MAIS JUSTA?

5 - HÁ OU NÃO HÁ PRECONCEITOS E INTOLERÂNCIA PRESENTES NESTE PROJETO DE LEI "ESCOLA SEM PARTIDO"?



 _________

1 – Assistente Social, professora universitária e cidadã que defende a qualidade, a universalidade, a equidade e a integralidade do ensino público brasileiro. 

Obs: Entre as produções acadêmico-científicas produções, destaca-seMorte materna: uma expressão da ‘questão social’, publicado pela Revista Serviço Social e Sociedade nª 102. São Paulo: Cortez, 2010. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S010166282010000200004&script=sci_abstract&tlng=pt ; 


sábado, 15 de outubro de 2016

Aos Mestres, com carinho

A todos os professores e professoras, meus e minhas companheiras de luta,
Queridos e queridas companheiras (os),
Hoje, 15 de outubro, comemoramos, mais uma vez, o Dia do Mestre. E lá se vão cerca de 66 anos e comemoração no Brasil, embora há muito mais tempo o 15 de outubro tenha sido consagrado à Santa Tereza D'Ávila. Nesta data, no ano de 1827, o imperador, D. Pedro I, decretou a criação do Ensino Elementar no Brasil.

E tanta coisa ocorreu em nossa história... E tanta coisa acontece em nossa história... Tantas histórias se cruzam às nossas, em sala de aula, nos corredores, nos pátios...
Quantos olhares nos olham brilhantes de alegria, de vontade de saber... E quantos outros olhares nos olham denunciando o pranto contido e o pânico, diante da ameaça de não entender... E ainda quantos tantos outros olhares brincalhões, que rodopiam todo o cenário, como piões luzentes que pairam no ar... Ah, como é difícil trazê-los à terra.
E vão-se os dias e, a cada dia, chegam histórias... E tantas histórias a mais para contar: o texto árido para trabalhar; as noites varadas com provas e provas e mais provas... e aquelas notas que insistem em afundar... Ah, e outras, tão poucas, que sobem a brilhar.
Diante do espelho, cara a cara, o professor... Ora se culpa, ora se absolve... Ora chora, ora sorri querendo acolher um a um de seus alunos.
E poucos passam as séries, pouquíssimos sobem de nível de instrução... E desses poucos, muitos nos abrem tantas lacunas.
E na sala de aula, em frente à lousa, diante dos olhos, veem lá, o professor, a professora.
E tantas lutas a vencer:
  • Para o aluno, 

a chegada à sala, o acesso ao texto, a prova, os trabalhinhos que dão um trabalhão, a nota... Dia a dia, mês a mês, ano a ano.
  • Para o professor,

as salas abarrotadas, as bolsas cheias de livros e trabalhos;
a mercantilização do ensino e a venda de ilusões em brilhantes canudos... E para quem paga, a preço de ouro;
o descompromisso das autoridades, que sucateiam o ensino público, barateiam a mão de obra dos professores e inventam fórmulas mágicas para que os alunos não permaneçam grudados no mesmo banco, na mesma sala, na mesma série, no mesmo nível;

  • E para todos,

a esperança de um futuro melhor.
Tantas batalhas, algumas vitórias, muitas derrotas...
Somos professores diante de um rio para atravessar. E na mesma margem, estão aqueles que chegam a nós para receberem as chaves que os ajudarão a abrir as portas do conhecimento.
É um rio largo... É um rio fundo... É um rio longo... É um rio...
(É... Esse rio a cada dia fica ainda mais intenso... Hoje encontramos o que nunca esperaríamos encontrar: tropa de choque da polícia; bombas de efeito moral; spray de pimenta e cassetetes de borracha...)
E como é de se prever em rio longo, há corredeiras, cachoeiras... E em rio que atravessa florestas há também cobras e jacarés... Além de muitas pedras... Mas é um rio que carrega flores, sementes, frutos e uma variedade de vidas... Um rio que nos mostra (e sempre mostra!) um belíssimo horizonte.
É assim que vejo nosso labor, companheiros e companheiras: estamos todos diante de um rio para atravessar, a questão é conhecer o rio, selecionar os instrumentos, desenhar a estratégia para organizarmos a travessia com segurança.
A todos os que foram meus mestres (dentro e fora de sala de aula) e a todos os meus companheiros e companheiras de profissão, eu desejo que o sol possa nos proporcionar a mais bela Aurora no Sistema de Educação de nosso país.
Força sempre!!!!
Luzia M. Cardoso


sexta-feira, 7 de outubro de 2016

LIVRE ESCOLHA



 Art. 19-J. Os serviços de saúde do Sistema Único de Saúde - SUS, da rede própria ou conveniada, ficam obrigados a permitir a presença, junto à parturiente, de 1 (um) acompanhante durante todo o período de trabalho de parto, parto e pós-parto imediato.§ 1o O acompanhante de que trata o caput deste artigo será indicado pela parturiente.  § 2o As ações destinadas a viabilizar o pleno exercício dos direitos de que trata este artigo constarão do regulamento da lei, a ser elaborado pelo órgão competente do Poder Executivo.” (Lei Nº 11.108, de 07 de abril de 2005, Capítulo VII)



I. Gestação e Parto



A concepção, a gestação e o parto são situações inerentes ao processo de reprodução humana, embora de natureza fisiológica, envolvem fatores emocionais e afetivos vividos tanto pela gestante quanto pelo grupo que a cerca, em especial o pai do bebê, os avós, irmãos, tios e tias, além do da necessidade de reorganização do núcleo familiar para acolher o novo membro que está sendo gerado.

A concepção, a gestação e parto também têm impactos políticos, sociais e econômicos nas sociedades, necessitando da intervenção dos governantes, visto que as taxas de natalidade de uma nação demandam por políticas sociais voltadas à saúde, educação e desenvolvimento social e afetivo dos atores envolvidos que, consequentemente, necessitam de unidades executoras que formem a rede de proteção necessária. 

No que se refere às particularidades da gestante no momento da gestação e do parto, muito já se produziu no campo acadêmico-científico acerca dos aspectos psicológicos e emocionais que acompanham todo o processo de modificação do corpo, seja pela influência dos hormônios, seja pelos apelos sociais, econômicos e culturais de cada localidade e de cada grupo familiar, seja pelas dificuldades inerentes às mudanças no centro gravitacional da mulher, provocando uma certa dificuldade no caminhar, no ritmo e na autonomia para as atividades da vida diária. Todo esse processo se desenvolve e intensifica com a evolução da gestação. 

Essas modificações vividas pela gestante, além das preocupações e expectativas com relação à nova vida que gera, se tornam uma carga bastante pesada para ela carregar sozinha, necessitando, nesse momento, de uma rede sociofamiliar firme, bem como de acesso aos equipamentos que necessitará durante a gestação, pré-parto, parto, aleitamento etc. 

Naturalmente, o período da gestação é uma fase onde há medos, angustias, inseguranças, fantasias e esses medos, angústias, inseguranças e fantasias tendem a se intensificar no momento do parto. Quantas mulheres gestantes não entraram em pânico ao imaginar serem maltratadas na hora do parto ou não se sentiram a ponto de enlouquecer diante da possibilidade de roubarem ou trocarem o seu bebê? Afinal, o que não faltam são histórias e que chegam à mulher justamente quando ela está gestante.


II. O Acompanhante é Aquele de Livre Escolha da Parturiente



Não há dúvida de que a gestação, o parto e o pré-parto (evidentemente que também o aleitamento, a supervisão e a criação da prole) não podem ser vividos sozinhos pela gestante, há que ser compartilhados com a família, com a sociedade e mesmo com o Estado, cada um com a sua função e parcela de responsabilidade, garantindo o apoio indispensável para que esse momento seja vivido com segurança e com alguma tranquilidade. 

E foi pensando em contribuir para a tranquilidade e segurança da gestante que a Lei 11.108\2005 foi sancionada, garantindo à parturiente um acompanhante de sua livre escolha durante o pré-parto, parto e pós-parto e, assim, ofertar-lhe condições emocionais melhores, viabilizando a proximidade e o apoio da pessoa por ela escolhida. 

E por que a Lei refere-se à livre escolha da gestante à pessoa que deverá acompanhá-la nesse momento tão especial?  Para garantir a segurança e o conforto emocional da gestante. Ao mesmo tempo, contribuir para que ela possa compartilhar as suas preocupações e necessidades com alguém de sua confiança. Sentindo-se protegida e segura, o parto tende a ser mais tranquilo, o aleitamento materno tende a ser mais fácil, bem como constroem-se, assim, as bases da maternagem em si, de forma que tal momento possa ser vivenciado e registrado como uma experiência positiva na história da mãe, do bebê e do grupo social e familiar.

O legislador também objetivou vencer resistências e preconceitos que, porventura, pudessem cercear o direito da parturiente à escolha de seu acompanhante, como acontece em muitas unidades de saúde que resistem em permitir a presença do acompanhante masculino, alegando que as enfermarias são coletivas, que falta privacidade, que há a necessidade de espaço para a circulação da equipe e de equipamentos etc. Sem dúvida que as unidades de saúde deverão adaptar as suas estruturas para garantir o direito da parturiente e do próprio bebê.

Quando o acompanhamento da gestante é feito pelo pai do bebê, ou por aquele ou aquela que compartilhará com ela da criação desse novo ser, reforçar-se-á, também, os laços afetivos desse grupo familiar. Tanto na vivência do momento quanto nos cuidados nas primeiras horas da mãe e do bebê.
Contudo, muitas vezes, por motivos diversos, a pessoa de escolha da gestante é uma amiga, um amigo, seu próprio pai ou mãe, avó ou avô, tia ou tio, prima ou primo, enfim, qualquer pessoa cuja presença dê a segurança necessária à gestante para esse momento. 

O ou a acompanhante escolhido\a pela gestante para acompanhá-la no pré-parto, parto e pós-parto tem, portanto, um papel muito importante, tanto no processo da preparação da mãe, dando-lhe apoio e afeto, quanto na chegada do bebê, compartilhando com a mesma das novas tarefas, nas boas-vindas dadas por meio de palavras, carinho e cuidados diversos. 



III. A Gestante Poderá Indicar Qualquer Pessoa de sua Livre Escolha para Acompanhá-la Durante o Pré-parto, Parto e Pós-parto?



A resposta a essa questão nos remete ao escopo da lei citada que ao apontar o direito da gestante determina o dever das unidades de saúde de oferecer condições para garantir-lhes o direito ao acompanhamento, sem determinar gênero, parentesco, raça ou religião. Contudo, apesar da Portaria 2.418, de 02 de dezembro de 2005, há a necessidade de definição de parâmetros mais claros para a compreensão de conceitos apresentados na Lei, entre eles o que se entende por acompanhante e por acompanhamento, apesar da referida Portaria destinar-se a regulamentar e lei aqui tratada. 

Caberá ao órgão responsável pela execução da política de saúde no Brasil ou ao Conselho de Direito da Mulher, junto ao Conselho de Direito da Criança e do Adolescente, definir os parâmetros para esse acompanhamento, de forma a dar segurança aos gestores e aos profissionais das unidades de saúde que, sozinhos, não podem trazer para si a responsabilidade de aplicar a referida Lei ao pé da letra ou de serem acusados de supressão de direitos ao contextualizá-la no âmbito das leis que devem respaldá-la (a Constituição da República Federativa do Brasil, o Código Civil, o Código Penal e as Cartas de direitos). 

Se, por um lado, pode-se entender que qualquer pessoa escolhida pela gestante poderá acompanhá-la no pré-parto, no parto e no pós-parto, por outro, há as implicações em relação à necessidade de que tal acompanhante responda civil e penalmente por seus atos e tenha plenas condições de exercer o papel que se reserva ao acompanhamento, ou seja, de assegurar à gestante o apoio emocional para a vivência do pré-parto, do parto e do pós-parto. Talvez seja essa a questão a ser ponderada pelo legislador, gestores profissionais de saúde visando o melhor acolhimento de ambos (gestante e acompanhante). 

Há, no entanto, outras responsabilidades que não podem escapar ao legislador, ou seja, aquelas que apontam para a garantia dos direitos daquele ou daquela pessoa indicada para o acompanhamento. Sim, pois o direito de um não pode ferir o direito do outro. Por isso que a regulamentação da Lei tem que ser clara e dar segurança à sua operacionalização.

Também no processo de acolhimento à gestante e aos seus familiares, de preferência, já no pré-natal, a discussão sobre o direito ao acompanhamento no pré-parto, parto e pós-parto tem que ser iniciada, visto que o processo de acompanhamento da gestante deve ser pactuado entre ela e aquele ou aquela pessoa por ela escolhida, para que não seja algo imposto e nem traga prejuízos de natureza ou espécie alguma.

Se a relação gestante\acompanhante se dá entre duas pessoas plenamente capazes de responder civil e penalmente por suas ações, os gestores das unidades de saúde, por meio de programas e profissionais capacitados, deverão assegurar que o acolhimento promova a reflexão acerca da importância do acompanhamento e de como cada pessoa presente no círculo da gestante poderá participar.

Contudo, o gestor precisa que a Lei e a sua regulamentação lhe indique, com precisão, os limites de sua responsabilidade, visto que se a gestante desejar que a pessoa a lhe acompanhar no pré-parto, no parto e no pós-parto seja alguém que, por motivos de idade ou outros motivos o tornem inimputável - podendo responder civil e penalmente por suas ações - para garantir os direitos dos atores envolvidos e para responder às necessidades inerentes a cada um, o gestor terá que trazer para si uma responsabilidade que vai além dos objetivos da própria unidade de saúde que administra. 


Por exemplo, no caso de uma gestante indicar um adolescente para acompanhá-la. Considerando que, se foi escolhido pela gestante, trata-se de pessoa cuja presença é importante para ela. Se o processo de acompanhamento não ferir os direitos constitucionais e aqueles garantidos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), e se o processo de acompanhamento respeitar os limites do mesmo e que são inerentes ao fato de ser uma pessoa em processo de desenvolvimento físico, psíquico, afetivo e social, garantindo-se o que for necessário para atender as necessidades de um adolescente, em princípio, talvez, não haja nenhuma contestação em que ele, ou ela, acompanhe a gestante no pré-parto, parto e pós-parto. 

Contudo, segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), considera-se adolescente a pessoa entre doze anos completos a 18 anos incompleto, embora a literatura acadêmico-científica apresente a pré-adolescência entre 10 a 13 anos de idade, considerando ser essa a fase do início da puberdade, diferenciando-a da adolescência. 


Há, assim, uma compreensão diferenciada entre a ciência e a Lei. A primeira compreende o tempo de desenvolvimento da pessoa e que trará mudanças físicas, emocionais e sociais. Já o segundo, embora levando em consideração as discussões no mundo acadêmico, considera a idade para essa classificação.


Nesse sentido, para as unidades de saúde garantirem que a gestante tenha um acompanhante adolescente, há que se entender que os de 12 a 15 anos têm necessidades e responsabilidades diferentes daqueles de 16 a 18 anos de idade. Assim, caso o\a referido\a acompanhante seja um adolescente, o gestor da unidade de saúde deverá cuidar para que o acompanhamento se dê de forma que todos direitos legalmente assegurados a esse ou a essa acompanhante adolescente sejam resguardados. 

Agora, como a Lei 11.108, de 12 de abril de 2005, bem como as que a regulamenta, não definem com precisão quem poderá ser acompanhante da parturiente, determinando apenas que deverá ser uma pessoa de sua livre escolha, há margem para que se entenda que a gestante poderá escolher como sua acompanhante, inclusive, uma criança, considerando como criança a faixa etária delimitada pelo ECA (de 0 a 12 anos incompletos). 

Diante da amplitude do texto da referida Lei, cabe, portanto, uma ampla reflexão, retornando aos objetivos do texto legal sobre o direito da gestante ao acompanhante e às leis que devem respaldá-la, também caberá a reflexão sobre a definição do papel do acompanhante, dos direitos que a ele deverão ser assegurados, das responsabilidades e do fato de que crianças, pré-adolescentes e adolescentes estão em fase de desenvolvimento físico, cognitivo, emocional e social, necessitando que lhes sejam asseguradas condições para que esse desenvolvimento ocorra sem riscos de dano de natureza alguma.

Vejamos alguns parâmetros legais que devem ser considerados:

a) Constituição da República Federativa do Brasil de 1988:

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (EC no 45/2004)” (Grifos meus); 

• “Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (EC no 26/2000 e EC no 64/2010)”; (Grifos meus);
Art. 227º. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão; (EC no 65/2010) (Grifos meus) 

b) Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Novo Código Civil)


• “Art. 5º. São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil: 
I - Os menores de 16 anos. 
II - os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos; 
III - os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade. (Grifos meus)

• “Art. 4º São incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de os exercer:

I - os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;
II - os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido;
III - os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo;
IV - os pródigos.

Parágrafo único. A capacidade dos índios será regulada por legislação especial.” (Grifos meus)




• “Art. 2º. Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade.  

Parágrafo único. Nos casos expressos em lei, aplica-se excepcionalmente este Estatuto às pessoas entre dezoito e vinte e um anos de idade.” (Grifos meus); 

• “Art. 3º. A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.” (Grifos meus).

Parágrafo único. Os direitos enunciados nesta Lei aplicam-se a todas as crianças e adolescentes, sem discriminação de nascimento, situação familiar, idade, sexo, raça, etnia ou cor, religião ou crença, deficiência, condição pessoal de desenvolvimento e aprendizagem, condição econômica, ambiente social, região e local de moradia ou outra condição que diferencie as pessoas, as famílias ou a comunidade em que vivem. (incluído pela Lei nº 13.257, de 2016)

• “Art. 4º. É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.” (Grifos meus); 

• “Art. 7º. A criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência.” (Grifos meus); 
• “Art. 8º. É assegurado a todas as mulheres o acesso aos programas e às políticas de saúde da mulher e de planejamento reprodutivo e, às gestantes, nutrição adequada, atenção humanizada à gravidez, ao parto e ao puerpério e atendimento pré-natal, perinatal e pós-natal integral no âmbito do Sistema Único de Saúde. (Redação dada pela Lei nº 13.257, de 2016).
§ 6o. A gestante e a parturiente têm direito a 1 (um) acompanhante de sua preferência durante o período do pré-natal, do trabalho de parto e do pós-parto imediato. (Incluído pela Lei nº 13.257, de 2016)”;
• “Art. 12º. Os estabelecimentos de atendimento à saúde, inclusive as unidades neonatais, de terapia intensiva e de cuidados intermediários, deverão proporcionar condições para a permanência em tempo integral de um dos pais ou responsável, nos casos de internação de criança ou adolescente. (Redação dada pela Lei nº 13.257, de 2016).”

A Lei 11.108, de 07 de abril de 2005, por seu texto amplo, dá margem a um triplo entendimento:

a) Poderá ser acompanhante de gestantes no pré-parto, parto e pós-parto, pessoa de sua livre escolha independentemente de sua idade e de suas condições legais para responder pelos atos da vida civil;

b) Poderá ser acompanhante de gestantes no pré-parto, parto e pós-parto, pessoa de sua livre escolha desde que seja pessoa total ou relativamente capaz para certos atos da vida civil, conforme a Lei nº 10.406, de 10.01.2002 (Novo Código Civil Brasileiro);

c) Para o exercício do acompanhamento da gestante no pré-parto, parto e pós-parto a pessoa de sua livre escolha deverá ser pessoa plenamente capaz para os atos da vida civil, conforme a Lei nº 10.406, de 10.01.2002 (Novo Código Civil Brasileiro).

Por outro lado, o ECA, ao incorporar os direitos da gestante adolescente à livre escolha de seu acompanhante no artigo 8º parágrafo 6º, cria um impasse com relação ao direito da mesma, quando se analisa o artigo 12º.

Verifica-se a urgência de que a Lei 11.108, de 07 de abril de 2005, tenha os seus parâmetros melhor definidos pois, até mesmo para garantir os direitos da gestante adolescente, o gestor terá que, ele mesmo, decidir se respeita a livre-escolha da mesma sobre quem será o seu acompanhante, conforme art. 8º, parágrafo 6º do ECA ou se determina que o seu acompanhante deverá ser um de seus pais ou um de seus responsáveis legais, conforme o art. 12 do referido Estatuto.

Nenhuma das legislações existentes acerca da política de atenção ao pré-parto, parto e pós-parto esclarecem essa questão acerca de quem pode ser acompanhante de livre escolha da gestante. Vejamos:

ü A Portaria Nº 569, de 1º de junho de 2000, já naquele ano, quando instituiu o Programa de Humanização no Pré-natal e Nascimento, no âmbito do Sistema Único de Saúde. http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2000/prt0569_01_06_2000_rep.html, em seu artigo 2º, determina:

“b - toda gestante tem direito ao acompanhamento pré-natal adequado de acordo com os princípios gerais e condições estabelecidas no Anexo I desta Portaria;"

ü A RDC 36, de 03 de junho de 2008 trata do Regulamento Técnico para Funcionamento dos Serviços de Atenção Obstétrica e Neonatal. Apenas no Anexo II, fala do acompanhante, também mantém ampla e vaga a compreensão:

"3.4 - Humanização da atenção e gestão da saúde: valorização da dimensão subjetiva e social, em todas as práticas de atenção e de gestão da saúde, fortalecendo o compromisso com os direitos do cidadão, destacando se o respeito às questões de gênero, etnia, raça, orientação sexual e às populações específicas, garantindo o acesso dos usuários às informações sobre saúde, inclusive sobre os profissionais que cuidam de sua saúde, respeitando o direito a acompanhamento de pessoas de sua rede social (de livre escolha), e a valorização do trabalho e dos trabalhadores." (Grifos meus).

"9. PROCESSOS OPERACIONAIS ASSISTENCIAIS
9.1 O Serviço deve permitir a presença de acompanhante de livre escolha da mulher no acolhimento, trabalho de parto, parto e pós-parto imediato." (Grifos meus)."

ü Caderno que trata da Humanização do Parto e do Nascimento. Enfatiza as resistências de unidades de saúde em garantir às parturientes o acompanhamento por alguém de sua escolha e trata também do cerceamento à presença do homem no acompanhamento. Nesse sentido, uma das diretrizes é garantir o direito da parturiente, independentemente de ser homem ou mulher a pessoa que irá acompanhá-la. (p. 13).

ü Manual de Acolhimento e Classificação de Risco em Obstetrícia:


"Por meio de ações que buscam a ampliação do acesso e melhoria da qualidade do pré-natal, da garantia de vinculação da gestante aos serviços de referência para atendimento integral, da implementação de boas práticas, incluindo o direito ao acompanhante de livre escolha da mulher, e do acesso ao planejamento reprodutivo, a Rede Cegonha articula os seguintes objetivos: " (p. 1)

Todos os documentos citados falam do direito da gestante à livre escolha de seu acompanhante no pré-parto, parto e pós-parto, contudo, não definem os parâmetros legais e estruturais para a garantia do direito, de forma que o gestor ficará entre a cruz e a espada se decidir que a liberdade de escolha da gestante deve se sobrepor aos limites presentes na Constituição, Código Civil e Estatuto da Criança e do Adolescente.


IV. Considerações ainda longe de serem finais



A sociedade brasileira muito tem avançado no direcionamento da garantia de direitos, tendo em vista o processo histórico de organização e luta de movimentos sociais. Nesse mesmo sentido, muitos profissionais na linha de frente da assistência e da gestão de unidades executoras das políticas sociais, muito se esforçam no sentido de garantirem serviços de qualidade e que assegurem direitos.

No âmbito da saúde, além das políticas específicas, programas têm sido elaborados e implementados para esse fim, bem como a definição de linhas de cuidados, de forma a garantir a equidade e a integralidade da assistência. Da mesma forma vem ocorrendo com relação à saúde da mulher, e aqui em especial, da gestante, visando assegurar-lhe não apenas os serviços que ofertem a assistência necessária, bem como empreendendo esforços no sentido de garantir-lhe conforto, segurança e apoio, tão importantes no momento do pré-parto, parto e pós-parto. 

Muitas cartas de direitos e leis vêm ao encontro da garantia do direito da mulher, em particular, da gestante, demandando mudanças na estrutura física e na capacitação de recursos humanos das instituições envolvidas. No que concerne ao direito ao acompanhamento da gestante, tema aqui refletido, há que se considerar que embora haja uma lei específica tratando da questão, ela precisa de melhor regulamentação, visto que cada nova lei remete a leis anteriores que resguardam direitos e apontam deveres dos cidadãos, bem como o papel de cada ente federativo e dos atores sociais e institucionais envolvidos. 

Nesse sentido, é fato que o direito da gestante ao acompanhante de sua livre escolha no momento do pré-parto, parto e pós-parto deve lhe ser assegurado, desde que, nos parâmetros legais, de forma que torna-se imprescindível compreender que esse direito não presume ser dever das unidades de saúde cuidar de crianças e pré-adolescentes e nem de lhes supervisionar as ações, caso eles venham a ser escolhidos como acompanhantes de gestantes. Lembremos que a condição tanto de crianças quanto adolescentes de pessoas em desenvolvimento, bem como o fato de ela não responderem por seus atos, lhes garante o direito a cuidados e supervisões. Da mesma forma, lembremos que estando a gestante sob a assistência de profissionais de saúde, e necessitando de segurança, tranquilidade e apoio emocional, não seria justo delegar-lhe esta responsabilidade. 

Assim, a fim de se garantir os direitos da gestante ao acompanhante de sua escolha no pré-parto, parto e pós-parto e enquanto a Lei 11.108\2005 não for mais especificamente regulamentada, talvez se tenha que definir alguns limites para, com segurança e respeito aos direitos de todos os atores envolvidos, viabilizar o acompanhamento a partir das demais leis existentes, garantir a mulher e ao seu círculo familiar e social uma vivência segura, tranquila, digna, respeitosa e com direitos assegurados, para que a gestação, pré-parto, parto e pós-parto sejam lembrados com muito carinho. 


Por outro lado, serão sempre bem-vindas ações que possibilitem a aproximação, estreitando lações de afetos, entre crianças, pré-adolescentes e adolescentes envolvidos com o núcleo familiar da mãe e do bebê, contudo, que os primeiros participem dessas ações não precisam se tornarem ‘acompanhantes”. Há experiências interessantes na forma de visitação, onde se promove as condições necessárias para que a visitação se dê e todos possam dar as boas-vindas ao novo membro da família, bem como acolher com a feto a mamãe.

Luzia Magalhães Cardoso
07\10\2016



quarta-feira, 31 de agosto de 2016

Penúltima Noite do Mês de Agosto



Ontem, discursos vazios e metálicos ecoaram em Brasília e invadiram a atmosfera brasileira, justamente na penúltima noite do mês de agosto do ano de 2016.


Por meio da oratória, sem materialidade de crime algum, vimos serem torcidas e distorcidas a Constituição da República Federativa do Brasil, as leis e os fatos, a fim de que, amassados, pudessem ser conformados à cassação da Presidenta Dilma Rousseff.


Ontem, a cada fala que visava convencer o povo brasileiro das justificativas para o que denominaram de impeachment, soava-nos como que filhos e netos à antessala de um CTI de hospital a receberem notícias da falência de órgãos vitais daquela que, no seio da família, é o que há de mais precioso.

Ontem, na penúltima noite do mês de agosto, o povo brasileiro recebeu a notícia da morte, abrupta e violenta, da nossa Democracia.

Hoje, amigos e amigas, entregar-nos-ão a Declaração de Óbito de nossa jovem Democracia para que, após a velarmos, ela seja, pelos próprios algozes, sepultada. Hoje, provavelmente, nas dobras daquela que será a última noite do mês de agosto, e que viveremos neste ano de 2016.

Rogo-vos, encarecidamente, não choremos e nem baixemos os olhos e, tampouco, curvemos os nossos ombros. Sigamos enfrente, lado a lado, ombro a ombro, cabeças erguidas, passos firmes e olhos no horizonte. Há muitas rosas a serem plantadas naquele mesmo jardim, semeado em outonos e invernos, que nos trouxeram as inúmeras flores que construíram primaveras.

Amigos e amigas, fiquemos em pé, atentos, prontos e fortes, porque não tropeçamos em montanhas!

Luzia M. Cardoso