PROJETO DE LEI DO SENADO Nº 193\2016:
QUEREM
INSTITUIR ESCOLA SEM PARTIDO OU ESCOLA DE UM PARTIDO?
Luzia Magalhães C ardoso1
O Projeto de
Lei Escola sem Partido foi, inicialmente, apresentado no ano de 2015, pelo
Deputado Federal, do PSDB de Minas Gerais, Izaci Lucas
(disponível
em http://www.camara.gov.br/…/prop_mostrarintegra;jsessionid=5… ).
Neste ano, o Projeto de Lei foi reapresentado, com algumas modificações, pelo
Senador Magno Malta, Partido da República, Espírito Santo e tramita no Senado
como PROJETO DE LEI DO SENADO Nº 193, DE 2016, (disponível emhttp://www.senado.leg.br/ativid…/rotinas/materia/getPDF.asp….
Refletindo acerca do título do
Projeto de Lei “Escola sem Partidos” deixamos claro que a Escola livre de
doutrinações políticas e ideológicas, sem influências partidárias é o que
preconiza os princípios constitucionais brasileiros, bem como os éticos do corpo
de docente. Também é o que deseja toda a sociedade.
O referido Projeto de Lei busca se inserir no a Lei
nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da
Educação Nacional (disponível emhttps://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm).
Ao lermos os dois primeiros
artigos do referido Projeto de Lei, e os itens I a V, verificamos a sua
correspondência na Constituição Federal de 1988, no Capítulo III, Seção I,
artigos 205 e 206. Vemos que a NOSSA CARTA CIDADÃ JÁ DETERMINA QUE TAIS
PRINCÍPIOS SEJAM SEGUIDOS:
CONSTITUIÇÃO DE REPÚBLICA FEDERATIVA
DO BRASIL DE 1988
CAPÍTULO III: DA EDUCAÇÃO, DA CULTURA
E DO DESPORTO
Seção I: DA EDUCAÇÃO
“Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber;
III - pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;
IV - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;
V - valorização dos profissionais da educação escolar, garantidos, na forma da lei, planos de carreira, com ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos, aos das redes públicas; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº
53, de 2006) VI - gestão democrática do ensino público, na forma da lei;VII - garantia de padrão de qualidade.
VIII - piso salarial profissional nacional para os profissionais da educação escolar pública, nos termos de lei federal.”
Verificamos, no entanto, que os
itens VI a VII e seu parágrafo único e o artigo 5º, itens V e VI do referido
Projeto de Lei têm forma e texto distintos do que prega a nossa Carta
Constitucional e contribuem para cercear a Educação, contradizendo, se não
ferindo, os itens II e III do artigo 206 acima citado. Diz a Constituição no
item referenciado:
"Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber; III - pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;"
Diz o Projeto de Lei Escola sem Partido:
"Art. 2º. A educação nacional atenderá aos seguintes princípios: VI - educação e informação do estudante quanto aos direitos compreendidos em sua liberdade de consciência e de crença;"
“Artigo 5º. Art. 5º. No exercício de suas funções, o professor: "V - respeitará o direito dos pais dos alunos a que seus filhos recebam a educação religiosa e moral que esteja de acordo com as suas próprias convicções; VI - não permitirá que os direitos assegurados nos itens anteriores sejam violados pela ação de estudantes ou terceiros, dentro da sala de aula. ”
VAMOS REFLETIR:
Como que a educação e a
informação direcionadas aos estudantes dentro da escola poderão atender à
liberdade de consciência e crença de cada um (compreendendo que o Projeto de
Lei pretende que crenças e formas de pensar não sejam, de forma, alguma
questionadas) e, ao mesmo tempo, atender à liberdade de ensinar, de divulgar o
pensamento, garantindo o pluralismo de ideias e concepções pedagógicas (quando
as ideias construídas historicamente por renomados filósofos, sociólogos,
antropólogos, cientistas sociais, políticos e pesquisadores diversos
questionam-se umas às outras, bem como a própria existência humana) sem gerar o
contraditório, a reflexão, o questionamento e o debate?
Do mesmo modo ocorre com o item
VII do mesmo artigo do referido Projeto de Lei:
"VII - direito dos pais a que seus filhos recebam a educação religiosa e moral que esteja de acordo com as suas próprias convicções."
VAMOS REFLETIR:
Uma coisa é a
garantia Constitucional do respeito à liberdade de credo religioso, outra coisa
é a Educação que tem como princípio a liberdade, a democracia, o pluralismo e o
respeito às diferenças obrigar a cada unidade de ensino garantir que cada um de
seus alunos (em sua diversidade cultural, religiosa e de pensamento) adquira o
conhecimento existente no mundo (e correspondente a cada nível de ensino), de
forma a impedir que o aluno a reflita sobre as suas concepções morais,
religiosa e de vida.
Impedir a reflexão fere a própria proposta da
Educação que é formar indivíduos aptos à refletirem sobre a própria realidade
para nela intervirem, visando as necessidades sociais que são historicamente
determinadas.
NESSE SENTIDO, O PROJETO DE LEI APRESENTA UMA CAMISA
DE FORÇA E UMA MORDAÇA À EDUCAÇÃO
O Projeto de Lei, nesses itens,
fere a compreensão de que tudo na história se transforma, não só a realidade,
como a direção da ciência e a própria concepção sobre o mundo e a existência
humana.
Agora, vamos refletir sobre o texto do parágrafo
único do artigo VII do referido Projeto de Lei:
"Parágrafo único. O Poder Público não se imiscuirá na opção sexual dos alunos nem permitirá qualquer prática capaz de comprometer, precipitar ou direcionar o natural amadurecimento e desenvolvimento de sua personalidade, em harmonia com a respectiva identidade biológica de sexo, sendo vedada, especialmente, a aplicação dos postulados da teoria ou ideologia de gênero."
Percebe-se haver aí uma confusão
entre identidade de gênero e orientação sexual. Uma coisa é a identidade de
gênero, o gênero com que a pessoa se identifica, apesar dos componentes sociais
e culturais da construção do homem e da mulher presentes na sociedade e em seu
próprio grupo familiar e social. Outra coisa e orientação sexual, que é o
gênero pelo qual cada pessoa sente atração.
Como a realidade nos mostra, nem
sempre a construção social do homem e da mulher, baseados nos aspectos
anatômicos, determinam a atração sexual de cada um. Nem sempre a pessoa que
nasce com o corpo de mulher ou de homem se sente uma mulher ou um homem, embora
tenha sido educada dentro de uma cultura que relaciona a identidade à anatomia.
O texto do parágrafo único
também parece confundir o que significa "natural amadurecimento e
desenvolvimento" da personalidade do indivíduo, defendendo uma ideia
equivocada e preconceituosa de que os indivíduos que não se identificam com o
gênero associado à anatomia de seu corpo ou que não sentem atração pelo gênero
oposto não "amadurecem e não se desenvolvem em condições naturais".
Daí o Projeto de Lei induzir que
existe uma "ameaça na sociedade" que leva crianças e jovens "a
um desenvolvimento não natural", portanto, “anormal”.
Como medicação, bem à moda dos
choques elétricos e isolamento adotados na idade média para a loucura e doenças
incuráveis, e bem à moda da censura das ditaduras, o Projeto de Lei aponta um
instrumento para vigiar, controlar e punir os professores que não sigam linha a
linha, palavra a palavra, o texto do referido Projeto de Lei: fica instituída a
Delação.
Assim, o Projeto de Lei não
orienta o debate, conforme todas as democracias. Não, pelo contrário, ele
convoca os pais, os alunos e todo e qualquer cidadão a quando se sentirem
contrariados ou desrespeitados, antes de buscarem compreender os fatos dentro
da própria unidade de ensino, apresentarem a denúncia ao Ministério Público:
"Programa Escola sem Partido: Art. 8º. O ministério e as secretarias de educação contarão com um canal de comunicação destinado ao recebimento de reclamações relacionadas ao descumprimento desta Lei, assegurado o anonimato. Parágrafo único. As reclamações referidas no caput deste artigo deverão ser encaminhadas ao órgão do Ministério Público incumbido da defesa dos interesses da criança e do adolescente, sob pena de responsabilidade."
DEIXO, AQUI, ALGUMAS
PERGUNTAS:
1 - SERÁ QUE ESCOLAS E PROFESSORES DETERMINAM A
ORIENTAÇÃO SEXUAL DE CRIANÇAS E JOVENS?
2 - SERÁ QUE ESCOLAS E PROFESSORES TÊM O PODER DE
DETERMINAR A IDENTIDADE DE GÊNERO DE CRIANÇAS E JOVENS?
3 - OS FILMES, NOVELAS, AS PEÇAS DE TEATRO, OS
JORNAIS, REVISTAS, LIVROS E MÚSICAS QUE LEVAM À COMPREENSÃO DA DIVERSIDADE DE
GÊNEROS E DE ORIENTAÇÃO SEXUAL PRESENTES NA SOCIEDADE CONTRIBUEM PARA
INFLUENCIAR A ORIENTAÇÃO SEXUAL E A IDENTIDADE DE GÊNERO DE CRIANÇAS, JOVENS E
ADULTOS OU SÃO INSTRUMENTOS PARA ACABAR COM O PRECONCEITO, COM A DISCRIMINAÇÃO
E COM A VIOLÊNCIA?
4 - GARANTIR QUE AS DIFERENÇAS SEJAM COMPREENDIDAS,
ACOLHIDAS E RESPEITADAS AMEAÇA A SOCIEDADE OU A TORNA MAIS JUSTA?
5 - HÁ OU NÃO HÁ PRECONCEITOS E INTOLERÂNCIA
PRESENTES NESTE PROJETO DE LEI "ESCOLA SEM PARTIDO"?
_________
1 – Assistente Social, professora universitária e cidadã
que defende a qualidade, a universalidade, a equidade e a integralidade do ensino público brasileiro.
Obs: Entre as produções acadêmico-científicas produções,
destaca-se “Morte materna: uma
expressão da ‘questão social’, publicado pela Revista Serviço Social e
Sociedade nª 102. São Paulo: Cortez, 2010. Disponível em
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S010166282010000200004&script=sci_abstract&tlng=pt
;
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