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sábado, 23 de junho de 2012

Declaração Final da Cúpula dos Povos na Rio +20

Declaração final

Cúpula dos Povos na Rio+20 por Justiça Social e Ambiental
Em defesa dos bens comuns, contra a mercantilização da vida

Movimentos sociais e populares, sindicatos, povos, organizações da sociedade civil e ambientalistas de todo o mundo presentes na Cúpula dos Povos na Rio+20 por Justiça Social e Ambiental, vivenciaram nos acampamentos, nas mobilizações massivas, nos debates, a construção das convergências e alternativas, conscientes de que somos sujeitos de uma outra relação entre humanos e humanas e entre a humanidade e a natureza, assumindo o desafio urgente de frear a nova fase de recomposição do capitalismo e de construir, através de nossas lutas, novos paradigmas de sociedade.

A Cúpula dos Povos é o momento simbólico de um novo ciclo na trajetória de lutas globais que produz novas convergências entre movimentos de mulheres, indígenas, negros, juventudes, agricultores/as familiares e camponeses, trabalhadores/as, povos e comunidades tradicionais, quilombolas, lutadores pelo direito a cidade, e religiões de todo o mundo. As assembleias, mobilizações e a grande Marcha dos Povos foram os momentos de expressão máxima destas convergências.

As instituições financeiras multilaterais, as coalizações a serviço do sistema financeiro, como o G8/G20, a captura corporativa da ONU e a maioria dos governos demonstraram irresponsabilidade com o futuro da humanidade e do planeta e promoveram os interesses das corporações na conferencia oficial. Em contraste a isso, a vitalidade e a força das mobilizações e dos debates na Cúpula dos Povos fortaleceram a nossa convicção de que só o povo organizado e mobilizado pode libertar o mundo do controle das corporações e do capital financeiro.

Há vinte anos o Fórum Global, também realizado no Aterro do Flamengo, denunciou os riscos que a humanidade e a natureza corriam com a privatização e o neoliberalismo. Hoje afirmamos que, além de confirmar nossa análise, ocorreram retrocessos significativos em relação aos direitos humanos já reconhecidos. A Rio+20 repete o falido roteiro de falsas soluções defendidas pelos mesmos atores que provocaram a crise global. À medida que essa crise se aprofunda, mais as corporações avançam contra os direitos dos povos, a democracia e a natureza, sequestrando os bens comuns da humanidade para salvar o sistema econômico-financeiro.

As múltiplas vozes e forças que convergem em torno da Cúpula dos Povos denunciam a verdadeira causa estrutural da crise global: o sistema capitalista patriarcal, racista e homofóbico.

As corporações transnacionais continuam cometendo seus crimes com a sistemática violação dos direitos dos povos e da natureza com total impunidade. Da mesma forma, avançam seus interesses através da militarização, da criminalização dos modos de vida dos povos e dos movimentos sociais promovendo a desterritorialização no campo e na cidade.

Da mesma forma denunciamos a divida ambiental histórica que afeta majoritariamente os povos oprimidos do mundo, e que deve ser assumida pelos países altamente industrializados, que ao fim e ao cabo, foram os que provocaram as múltiplas crises que vivemos hoje.

O capitalismo também leva à perda do controle social, democrático e comunitário sobre os recursos naturais e serviços estratégicos, que continuam sendo privatizados, convertendo direitos em mercadorias e limitando o acesso dos povos aos bens e serviços necessários à sobrevivência.

A dita “economia verde” é uma das expressões da atual fase financeira do capitalismo que também se utiliza de velhos e novos mecanismos, tais como o aprofundamento do endividamento publico-privado, o super-estímulo ao consumo, a apropriação e concentração das novas tecnologias, os mercados de carbono e biodiversidade, a grilagem e estrangeirização de terras e as parcerias público-privadas, entre outros.

As alternativas estão em nossos povos, nossa historia, nossos costumes, conhecimentos, práticas e sistemas produtivos, que devemos manter, revalorizar e ganhar escala como projeto contra-hegemônico e transformador.

A defesa dos espaços públicos nas cidades, com gestão democrática e participação popular, a economia cooperativa e solidaria, a soberania alimentar, um novo paradigma de produção, distribuição e consumo, a mudança da matriz energética, são exemplos de alternativas reais frente ao atual sistema agro-urbano-industrial.

A defesa dos bens comuns passa pela garantia de uma série de direitos humanos e da natureza, pela solidariedade e respeito às cosmovisões e crenças dos diferentes povos, como, por exemplo, a defesa do “Bem Viver” como forma de existir em harmonia com a natureza, o que pressupõe uma transição justa a ser construída com os trabalhadores/as e povos.

Exigimos uma transição justa que supõe a ampliação do conceito de trabalho, o reconhecimento do trabalho das mulheres e um equilíbrio entre a produção e reprodução, para que esta não seja uma atribuição exclusiva das mulheres. Passa ainda pela liberdade de organização e o direito a contratação coletiva, assim como pelo estabelecimento de uma ampla rede de seguridade e proteção social, entendida como um direito humano, bem como de políticas públicas que garantam formas de trabalho decentes.

Afirmamos o feminismo como instrumento da construção da igualdade, a autonomia das mulheres sobre seus corpos e sexualidade e o direito a uma vida livre de violência. Da mesma forma reafirmamos a urgência da distribuição de riqueza e da renda, do combate ao racismo e ao etnocídio, da garantia do direito a terra e território, do direito à cidade, ao meio ambiente e à água, à educação, a cultura, a liberdade de expressão e democratização dos meios de comunicação.

O fortalecimento de diversas economias locais e dos direitos territoriais garantem a construção comunitária de economias mais vibrantes. Estas economias locais proporcionam meios de vida sustentáveis locais, a solidariedade comunitária, componentes vitais da resiliência dos ecossistemas. A diversidade da natureza e sua diversidade cultural associada é fundamento para um novo paradigma de sociedade.

Os povos querem determinar para que e para quem se destinam os bens comuns e energéticos, além de assumir o controle popular e democrático de sua produção. Um novo modelo enérgico está baseado em energias renováveis descentralizadas e que garanta energia para a população e não para as corporações.

A transformação social exige convergências de ações, articulações e agendas a partir das resistências e alternativas contra hegemônicas ao sistema capitalista que estão em curso em todos os cantos do planeta. Os processos sociais acumulados pelas organizações e movimentos sociais que convergiram na Cúpula dos Povos apontaram para os seguintes eixos de luta:

Contra a militarização dos Estados e territórios;
Contra a criminalização das organizações e movimentos sociais;
Contra a violência contra as mulheres;
Contra a violência as lésbicas, gays, bissexuais, transexuais e transgeneros;
Contra as grandes corporações;
Contra a imposição do pagamento de dívidas econômicas injustas e por auditorias populares das mesmas;
Pela garantia do direito dos povos à terra e território urbano e rural;
Pela consulta e consentimento livre, prévio e informado, baseado nos princípios da boa fé e do efeito vinculante, conforme a Convenção 169 da OIT;
Pela soberania alimentar e alimentos sadios, contra agrotóxicos e transgênicos;
Pela garantia e conquista de direitos;
Pela solidariedade aos povos e países, principalmente os ameaçados por golpes militares ou institucionais, como está ocorrendo agora no Paraguai;
Pela soberania dos povos no controle dos bens comuns, contra as tentativas de mercantilização;
Pela mudança da matriz e modelo energético vigente;
Pela democratização dos meios de comunicação;
Pelo reconhecimento da dívida histórica social e ecológica;
Pela construção do DIA MUNDIAL DE GREVE GERAL.
Voltemos aos nossos territórios, regiões e países animados para construirmos as convergências necessárias para seguirmos em luta, resistindo e avançando contra os sistema capitalista e suas velhas e renovadas formas de reprodução.

Em pé continuamos em luta!

Rio de Janeiro, 15 a 22 de junho de 2012.
Cúpula dos Povos por Justiça Social e ambiental em defesa dos bens comuns, contra a mercantilização da vida.

sábado, 16 de junho de 2012

Rio de Janeiro de quantos?





Óculos da estátua de Drummond = R$ 3.000,00 X 8 = R$ 24.000,00
Estimativa da Rio +20 para os cofres públicos = Mais de R$ 100.000.000,00
Orçamento da reforma do Maracanã = R$ 808.004.000,00
Obras para a Copa e as Olimpíadas + $$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$

E a Saúde e a Educação...


Fonte de consulta:


Portal da Copa. Site do Governo Federal: http://www.copa2014.gov.br/pt-br/noticia/obra-de-reforma-do-maracana-chega-56

Veja Rio de 21 de maio de 2012: http://veja.abril.com.br/noticia/brasil/rio-20-deve-custar-mais-de-r-100-mi-aos-cofres-publicos

Jornal do Brasil\ Rio de 2011: http://www.jb.com.br/rio/noticias/2009/12/28/drummond-de-oculos-novos/

quarta-feira, 13 de junho de 2012

Linha Saracuruna. Estação Bonsucesso: Do público ao privado, a concessão





As linhas que separam o público do privado ficam invisíveis quando o segundo adquire a concessão de administrar o primeiro. Propriedade privada e patrimônio público, o que pertence a um e o que pertence a todos. Essa é uma grande questão.

Hoje, um pouco antes de iniciar o meu trabalho, fui conhecer a estação do teleférico do Morro do Alemão, em Bonsucesso, Rio de Janeiro. Entraria no trabalho as 8:00h e cheguei as 7:20h. Tinha tempo. Não para atravessar os 3,5 Km integrados pelos cabos do teleférico do Complexo do Alemão, mas somente para conhecer a estação de Bonsucesso.

Não tive dúvidas e dirigi-me para lá. Desci a Av. Paris, atravessei a Rua Leopoldo Bulhões, para subir à escada que é comum tanto para a estação ferroviária, da Linha Saracuruna, quanto para o recém-criado teleférico.







Não consegui subir de imediato. A hora era do rush e uma massa humana descia aqueles degraus. Precisei deixar a corrente abrandar. Em menos de cinco minutos já conseguia subir na contramão da correnteza. Ao entrar tive uma boa surpresa com a limpeza, boa manutenção e iluminação, escadas rolantes e elevadores para o patamar seguinte, que dá acesso ao teleférico. Verifiquei que o bilhete para o teleférico custava R$ 1,00.  

Resolvi caminhar pelo andar de acesso à estação ferroviária e deparei-me com três painéis lindíssimos, feitos na parede, em mosaicos coloridos. Um indicando o nome da estação “Bonsucesso”, com desenhos retratando as pessoas na comunidade.




Outro com a legenda “Todos Juntos” com desenhos de pessoas de várias cores, tamanhos, adultos, crianças, cadeirantes e que juntos formam o desenho de um morro.



O terceiro era uma baiana estilizada, lembrando a Carmem Miranda e era o único que estava assinado por Romero Brito. 



Todos os painéis em cores intensas. Havia também um belo quadro com desenho estilizado dos caminhos dos cabos do bondinho subindo para outra estação do Complexo Alemão. 



Segundo as pesquisas que fiz na Internet, os painéis foram feitos com a participação dos moradores.

As paredes externas em vidro permitem a vista para a Praça das Nações, de um lado, e do outro, para a via férrea, com o movimento do teleférico ao alto. Uma bela vista.



Feliz da vida, e com um imenso prazer com tudo o que via, peguei o meu celular e comecei a fotografar. Em seguida, dirigi-me à bilheteria, desejando comprar um bilhete para o patamar do teleférico, embora não tivesse tempo para atravessar o Complexo do Alemão, estava disposta a pagar a tarifa apenas para conhecer o andar de cima.

Ah, mas nem tudo que reluz é ouro!! Ao dirigir-me ao caixa, a funcionária, embora de forma muito educada, no estilo funcionário padrão que busca a ascensão funcional na empresa, questionou-me se eu tinha autorização para fotografar. Disse-lhe, surpresa, que “não”. Em tom delicado, mas firme, prontamente disse: “Não pode fotografar sem autorização. Isso aqui é propriedade privada.” E devolveu-me o dinheiro, em vez de me dar o bilhete para subir ao andar de acesso ao teleférico.

Sem graça, constrangida e bastante confusa, sai da estação e fui para a empresa onde trabalho aguardar o horário do início de minha jornada.

Enquanto esperava, comecei a lembrar que a malha ferroviária do estado do Rio de Janeiro data do século XIX, e que passou por várias mudanças, com fechamento de ramais, sob administração federal, e depois para  a estadual, com mudanças de razões sociais das empresas que obtinham a concessão de administrá-la:  Estrada de Ferro Central do Brasil (EFCB), do início da República até os anos 50; Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima (RFFSA) até os anos 80; Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) até os anos 90; Companhia Fluminense de Trens Urbanos (FLUMITRENS), privatizada em 1998, leiloada e adquirida pela SupeVia, atual administradora de toda a malha ferroviária do estado do Rio de Janeiro, inclusive do teleférico do Complexo do Alemão, que se integrou à malha desde a sua inauguração, em julho de 2011.

Ah, mas se as empresas administradoras da malha ferroviária alegam que investem em manutenção, reformam equipamentos, contratam recursos humanos etc, elas logo restituem o seu capital com o valor das tarifas cobradas aos passageiros. Afinal, trata-se de um negócio e é, portanto, altamente lucrativo. Por outro lado, a malha ferroviária do estado do Rio de Janeiro também se ergueu com recursos públicos ao longo de toda a história. Recursos esses cujas principais fontes são os impostos pagos por todos nós, a população brasileira. Somente para elaboração do projeto do Complexo do Alemão, segundo a Rocinha.org, o governo do estado do Rio de Janeiro pagou R$ 12 milhões. O teleférico do Complexo do Alemão, classificado como "obra pública", pelo vice-governador do estado, em entrevista ao jornal Estadão de 07 de julho de 2011, foi construído com recursos públicos, inclusive do Projeto do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Segundo a BBC Brasil, também de 07 de julho de 2011, saíram dos cofres públicos R$ 210 milhões, sem contar com os custos da operação de ocupação e implantação das Unidades de Polícias Pacificadoras (UPP’s), imprescindíveis para garantir os interesses das concessionárias.

E aí eu me pergunto: Por que o cidadão brasileiro tem que pedir autorização para fotografar um bem público? Será que os turistas também são impedidos de fotografar? Ou será que seu bilhete já vem com uma autorização?  E com tanto investimento de recursos públicos, como que funcionários da SuperVia podem dizer, e acreditar, que o prédio da estação ferroviária ou qualquer das estações do teleférico do Complexo do Alemão é uma propriedade privada? Então, se a SuperVia quiser ela poderá fechar as portas, derrubar cada pilar das estações, vender as dormentes dos trilhos? Enrolar os cabos dos teleféricos e levar embora cada gôndola? Será que pode?

Afinal, uma empresa ao adquirir a concessão para administrar um patrimônio público passa a ser proprietária do mesmo?

E como não me pediram para apagar as fotos, entendo que podiam ser feitas.


Luzia M. Cardoso



Fontes de consulta

Emop\ Governo do Estado do Rio de Janeiro: http://www.emop.rj.gov.br/noticia_dinamica1.asp?id_noticia=325