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sábado, 5 de julho de 2014

A ARENA

Os heróis olímpicos, os heróis nacionais, os heróis do futebol, das olimpíadas, das corridas de carros: cria-se poucos Pelés entre tantos Garrinchas.




A ARENA



As arenas construídas para eventos de massa datam de muito longe na história da humanidade. Construídas no mundo antigo, época das grandes conquistas e da ostentação dos imperadores.

As arenas foram projetos para reunir a plebe e, em lugar de destaque, os soberanos, tendo, ao centro, aqueles designados para garantir o entretenimento. Tratava-se de um grande circo para extravasar a dor dos explorados e lançar névoa sobre a sua realidade. E a névoa ajudava a criar a torcida: uns, torcendo para um lado e outros, torcendo para o outro lado e, assim, ambos, esqueciam-se que pertenciam, todos, ao lado dos oprimidos. E, em local privilegiado, banqueteava-se a elite dominante e seus convidados. 

Enquanto isso, nos centros das arenas, a névoa se formava pela areia, pelo suor e pelo sangue dos que seriam abatidos e essa névoa se estendia à plateia, grudando os seus olhos e as suas mentes. 

Ao mesmo tempo, no centro das arenas, os gritos, o suor, o sangue e a dor dos que estavam lá para dar vida ao circo, num circo onde sempre havia quem caçasse e quem ficasse abatido ao chão. Nas arenas antigas, a luta dos gladiadores, de homens contra homens... De homens contra animais.

E as arenas, o circo, o mais eficaz instrumento de manipulação e de alienação das massas, se multiplicou, continua se multiplicando, e se sofistica, tanto em impérios quanto em repúblicas. E nessas arenas são testados os homens,  sua força e sua coragem. Também aí são testadas e apresentadas novas tecnologias. Também aí é avaliada a repercussão emocional que causa às massas.

E a plateia rodeia o centro da arena. E a plateia de hoje é mundial, é virtual e todos, dos quatro cantos do mundo, muitos milhares de pessoas, todos rodeiam o centro de uma mesma arena, com os soberanos, em destaque, que estão lá a lucrar. 

E ao redor da arena, a plateia extravasa as suas emoções... E as suas frustrações. Vibra, grita, canta, chora, torce, xinga, fica inflada, anestesiada para o que lhe espera do lado de fora da arena. A plateia se mascara, a massa é anônima, e na massa, cada um se perde em fantasia. Na massa anônima, nessa arena, os plebeus até xingam os soberanos, face a face. Não há cara nas arenas, todos usam máscaras. 

A plebe, na arquibancada e em poucas cadeiras, frente à elite, em preservados e luxuosos camarotes em destaque e que assiste a tudo sorrindo ao tilintar dos metais brilhantes que abarrotam os seus cofres. E, ao centro, os artistas do circo dando o seu suor, as suas lágrimas, o seu sangue, vencendo a dor...  A dor e o medo de ser um daqueles que tombará ao chão... Há sempre o que fica ao chão. Há sempre aquele que sai da arena carregado... E, também, sempre há aquele que é tragado pelo chão... E que nunca mais retornará... E, ainda no centro da arena, ainda entre os artistas do circo,  há aqueles que se investem em sentimento de nacionalismo, de patriotismo, de heroísmo e se mantém em pé... Bravos gladiadores, almejam  a aceitação dos soberanos, o orgulho da torcida e tudo o que que se materializará daí: o prêmio, o troféu, a medalha, o lugar de destaque no pódio dos vencedores e no imaginário da plateia, a fama e a conta bancária.

E a torcida vivencia o poder e a força do soberano, experiencia a crueldade da luta e se torna cúmplice da violência, das baixas e das mortes dos que se tornaram heróis ao centro da arena.

A massa, submersa em emoções, ao emergir, obedecerá passivamente à política da coerção e do medo, do chicote, pão e circo. E, no dia seguinte, caminhará, ombro a ombro, olhos ao chão, conforme a ordem social dominante.

AVE CAESAR!!!!

Luzia M.Cardoso

RJ, 05\07\2014

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