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terça-feira, 26 de maio de 2020

Confinadas Leituras II A Trilogia de Nova York - Fantasmas


Confinadas Leituras II
A Trilogia de Nova York - Fantasmas

Despertamos com uma granada furtivamente colocada no bolso de nossos jalecos brancos, de nossas camisas, de nossas jaquetas, calças compridas... 

Passaríamos, no mínimo, dois anos carregando esse explosivo nos nossos bolsos e que já fora programado para detonar. Parece não haver saída e, sobre o fato,  nós tomávamos conhecimento nesta última quinzena de maio.

Um maio de epidemias, não só viral, mas também moral. Tudo fora contaminado em grande escala. Não diria que em grande velocidade. Não para a imoralidade e amoralidade que a toda sociedade vitimavam.

Não. Se o coronavírus rodou o planeta e dizimou milhões de pessoas ceifando nos continentes, a simbiose da amoralidade e imoralidade instalada no Brasil foi se desenvolvendo durante séculos. Feito a bactéria de fermento na massa de pão que, acomodada, vai se expandindo, crescendo para todas as direções.

Sobre o meu sofá grená, frente a telas planas, assisto a aquarela se dissolvendo. Parece não haver mais limites entre as cores. Como se não houvessem mais lentes corretoras para astigmatismos e daltonismo.  Tudo se apresentava sendo um imenso borrão cinza-marrom-lama.

A sensação era a de estar vivendo dentro das telas de Salvador Dali. Não pelas cores, mas pelas experiências propostas.

Nada mais era sólido, firme, certo, definido.  A vida era como a memória de alguém acometido por Alzheimer: a curta não persistia e, as passadas, há tempos estavam derretendo.

Em plano alto, tudo apontava para uma grande mão em seu ir e vir frenético, à frente e atrás, frente e a frente e atrás... Nos horários de penúmbra, espalmando-se.

Insisto em desfolhar o livro de Paul Auster, agora, no segundo livro de sua trilogia.

Não sei mais se desfolhar seja a palavra ideal para descrever o ato de passar as páginas nos meios digitais. Talvez, estejamos destelando os livros...

Agora não mais nos debruçamos sobre folhas de papel, mas  sobre janelas. Passamos o tempo   espiando as janelas, de frente para as cenas iluminadas e de costas para dentro de nossos próprios aposentos. Observamos os fatos de costas para nós.

Vivemos em realidade paralela? Caímos num sono profundo e coletivo?

Estamos acoplados em algum pesadelo qualquer onde espectros elevam o tom, dia a dia...

Penso não ser um mero acaso que, nesse exato momento, eu esteja abrindo janelas e alinhando o meu binóculo para as que estão à minha frente. Não parece ser apenas uma coincidência eu  querer decifrar fantasmas.

Luzia M. Cardoso

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